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Autor: Marisa Gamboa

A morte pertence à vida, como pertence o nascimento.
O caminho tanto está em levantar o pé,

como em pousá-lo no chão.

TAGORE
In Pássaros Perdidos, CCLXVII

Imaginamos o momento e o trabalho com doentes (PESSOAS) terminais muito ESPECIAIS e, na verdade estamos certos! Coisas tão simples como sentarmo-nos “bem perto”, escutarmos e descobrirmos as suas necessidades (desafio enorme, tendo em conta que as necessidades variam, claramente, de pessoa para pessoa), tornam-se coisas enormes! Imaginamos dizer as palavras mais importantes e talvez o mais importante seja, apenas, estar e conter o que é partilhado, mesmo o silêncio, talvez e fundamentalmente, o silêncio! É neste encontro que devemos ter o nosso próprio processo de morte decifrado, porque se estivermos preparados para viver estaremos, possivelmente preparados para morrer. Talvez estejamos a falar da mesma preparação!

Imagino um encontro entre duas pessoas, um encontro onde deixamos no fundo do nosso espaço, o nosso medo, para que neste encontro possa apenas existir, compreensão, dignidade, respeito e o que o doente, a pessoa entenda. Deixemo-lo conduzir o nosso trabalho. Deixemo-lo fazer perguntas. Deixemo-lo ter dúvidas. Deixemo-lo gritar de uma dor que não compreende, não quer aceitar e que parece ter um “fim que não se que ver findado”. Deixemo-lo respirar com raiva e revolta. Deixemo-lo sentir. Permitimo-nos estar, gritar também, chorar, rir também (sim, rir, atenua a dor). Permitimo-nos sentir o que o outro sente…apenas isso!

Aqueles que têm a força e o amor para se sentar ao lado do paciente que está prestes a morrer no silêncio que transcende as palavras saberão que esse momento não é assustador nem doloroso, mas antes uma cessação pacífica do funcionamento do corpo (Elisabeth Kubler-Ross). Na verdade, a vida de quem acompanha, de quem sabe e pode estar nestes momentos, ganha uma história especial, envolvida num enredo de histórias. Parece e é poético, a forma como quem acompanha, enriquece com a peculiaridade de cada indivíduo, da sua história, do seu livro.

“Na minha cabeça, mastigo dez vezes cada frase,
corto uma palavra, acrescento um adjectivo,
e decoro o meu texto, parágrafo a parágrafo […]
É possível construir castelos no ar, conquistar
o Tosão de Ouro, descobrir a Atlântida,
realizar os sonhos de criança e os sonhos de adulto.”

Julian Schnabel In O Escafandro e a Borboleta