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Resumo: Saiba porque é que a relação com os nossos pais, ou cuidadores primários, é tão definidora do que somos (e do que ainda vamos ser).

John Bowlby, um psiquiatra e investigador britânico, do século XX, foi um dos primeiros a perceber a importância das primeiras relações que estabelecemos: com os nossos pais, ou cuidadores primários. Mais especificamente, ele estudou o efeito do abandono e da negligência, em crianças hospitalizadas, e percebeu que a relação com os adultos é primordial para a sobrevivência e para o desenvolvimento das crianças. Estes bebés, recém-nascidos, eram privados do contacto com os seus pais (ou cuidadores) e, por comparação com bebés que mantinham o contacto e o carinho dos seus pais, estes recuperaram mais lentamente das doenças e tiveram problemas de desenvolvimento mais tarde na vida.

De facto, John Bowlby tinha descoberto um facto muito importante para a compreensão dos seres humanos: quando nascemos, somos dependentes dos adultos, não só para comer e beber, mas também porque precisamos que cuidem de nós, que nos dêem carinho e atenção. Sem isso, não nos desenvolvemos correctamente e, mais tarde, teremos muitas dificuldades nos relacionamentos que estabelecemos – como veremos depois.

Vinte anos mais tarde, Mary Ainsworth, uma psicóloga canadiana-americana, encontrou que as crianças e os seus cuidadores podem estabelecer diferentes tipos de relações de vinculação, que apresentam características e consequências específicas. A sua descoberta foi feita através de uma experiência chamada “A Situação Estranha”, que ainda hoje é utilizada por psicólogos em todo o mundo, para compreender os comportamentos de vinculação de cada criança.

De forma resumida, foi definido que as relações de vinculação podem seguir 3 principais padrões: a vinculação segura, a vinculação insegura-ambivalente e a vinculação insegura-evitante. Para além destes, existe ainda a vinculação desorganizada, que é visível principalmente em crianças de pais com perturbações psicológicas graves (e.g. esquizofrenia).

Uma criança com um padrão de vinculação insegura-ambivalente, tal como diz no nome, estabelece uma relação ambivalente com os seus cuidadores. Estes, desde cedo, demonstram que não estão sempre lá quando o bebé necessita – o que provoca uma grande noção de imprevisibilidade na criança. Quando os cuidadores estão presentes e dão a atenção e o carinho que o bebé necessita, este tem uma reacção ambivalente, de querer que os cuidadores se mantenham mas ao mesmo tempo de os afastar por o terem abandonado anteriormente. Já uma criança com um padrão de vinculação insegura-evitante, normalmente tem cuidadores negligentes, que não dão o apoio e a atenção que um bebé necessita, e este desenvolve um afastamento emocional e físico dos adultos, na sua generalidade. Por último, uma criança com um padrão de vinculação seguro, sente que os seus cuidadores estão disponíveis para o apoiar e dar carinho e atenção quando necessitar, pelo que sentem que têm uma base segura de onde partir e explorar o ambiente em redor.

Toda esta informação pode parecer um pouco confusa, uma vez que se trata de uma teoria muito complexa e importante da psicologia, porém, o que significa é que a relação que estabelecemos com os nossos pais, ou cuidadores primários, é muito definidora das relações que iremos estabelecer na idade adulta – uma vez que é de tenra idade que aprendemos como o mundo lá fora nos trata, criando padrões de comportamento e de expectativas em relação aos outros. Deste modo, quando chegamos à idade adulta, estas relações de vinculação reflectem-se nos relacionamentos que estabelecemos – principalmente nos amorosos.

Uma criança que tenha estabelecido um tipo de vinculação segura, tenderá a crescer e a criar relações positivas, a ter facilidade em estabelecer relações e a encontrar um equilíbrio harmonioso entre intimidade e independência. Por sua vez, as crianças que estabeleçam um dos restantes tipos de vinculação, mais inseguros, poderão encontrar mais dificuldades ao relacionarem-se com os outros.

Por exemplo, podem tornar-se pessoas mais ansiosas nos relacionamentos, procurando insistentemente níveis de intimidade muito altos, pondo de parte a sua necessidade de alguma independência e espaço pessoal. Tipicamente, são pessoas mais impulsivas, preocupadas, emocionais e dependentes nas suas relações.

Por outro lado, podem tornar-se pessoas mais desligadas e independentes, que quase evitam o estabelecimento de relações amorosas e de compromisso. Para estas pessoas, os relacionamentos amorosos não são vitais para a sua vida, assumindo um papel meramente secundário, e são também pessoas que têm maior dificuldade em lidar com seus sentimentos.

Isto não significa que em adultos apenas podemos preencher um destes 3 tipos de comportamentos – trata-se de um modelo de categorização muito dinâmico, em que cada um de nós poderá preencher mais características de um tipo de vinculação ou de outro.

Mas já alguma vez tinha percebido isto, que todos nós temos visões muito diferentes sobre as relações adultas? E será que já tinha pensado que estas visões podem ser influenciadas pelas relações que estabelecemos em criança? Interessante, não é?