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Autor: Vanessa Damásio

“A vida familiar é a nossa primeira escola de aprendizagem emocional”.
Goleman, 1995

“Muitos pais têm filhos não para os amar e criar, mas porque querem servir-se deles como cobaias ou como satisfação sexual até.”
Patrícia, 14 anos (In Pedro Strecht, 2001)

A Família é, à partida, um espaço de proteção e segurança, onde a criança aprende a socializar, aprende normas, valores sociais, culturais e especialmente emocionais. A família é, para o bem e para o mal, uma base de aprendizagem, que facilitará na criança um processo de desenvolvimento cognitivo, sensorial, motor e afetivo. Se uma criança, na sua interação com os elementos significativos (família e outros), durante a sua infância, vive momentos de desproteção, violência, desprezo, agressão e abuso da sua fragilidade e inocência, acarretará no futuro ações e desvios comportamentais, cognitivos e emocionais, feridas abertas no seu coração, pensamento e corpo, que poderão demorar toda uma vida a sarar.

Assim sendo, pode-se considerar que há violência intrafamiliar contra crianças e adolescentes quando os seus familiares utilizam o poder que lhes conferem esses papéis para fins de dominação ou para satisfazer os seus desejos e necessidades pessoais, ou para descarregar a sua própria frustração e desequilíbrio no ser mais desprotegido e “fácil” de magoar. Cria-se assim uma confusão entre papéis e funções na mente da criança ou adolescente, principalmente no caso do abuso sexual, quando a violência física e emocional é acompanhada de cenas de sedução e carinho que mascaram o abuso.

Este tema está na ordem do dia, a agressão e o abuso estão patentes em todas as manchetes de jornais e telejornais, e cada vez mais temos conhecimento do sofrimento encoberto que vivem as vítimas de abuso sexual, principalmente quando se tratam de menores.

A criança vive assim uma situação traumática, onde se misturam sentimentos confusos de culpa, raiva, prazer, medo, vergonha, e oscila entre o silêncio e o segredo ou a denúncia de tais atos praticados por alguém que, por obrigação, deveria dispensar-lhe cuidado e proteção.

Os elementos significativos que rodeiam a vítima, podem ter suspeitas do abuso sexual, que muitas vezes tentam negar a eles próprios e aos outros, vivendo também situações de muita confusão e ambiguidade. Frequentemente negam os indícios, negam as suas perceções, recusam-se a aceitar a realidade, vivendo sentimentos ambivalentes em relação à vítima.

Na realidade, toda a família também é vítima, vítima secundária3, da violência familiar. Negar, desmentir ou culpar a vítima principal pela sedução pode ser uma forma de suportar o impacto da violência, da desilusão e da frustração diante da ameaça de desmoronamento da unidade familiar e/ou conjugal. Mas em qualquer das situações, a negação e silêncio, a afirmação de que nada aconteceu, é o pior que pode acontecer a uma criança vítima do abuso sexual.
Por tudo isto é importante estarmos atentos aos sinais e sintomas, quebrarmos o silêncio e denunciar!

Sinais e sintomas que denunciam a existência de violência sexual:

  • Mudança comportamental na escola ou no contexto familiar;
  • Diminuição do rendimento escolar;
  • Necessidade de super-estimulação ou insegurança;
  • Recusa ou medo de ficar com um adulto, ou sozinho com ele;
  • Medo de algumas pessoas ou lugares;
  • Problemas com os esfíncteres;
  • Perturbações do sono;
  • Depressão, ansiedade, fobias;
  • Afastamento, apatia ou indiferença;
  • Auto-mutilação;
  • Fuga;
  • Problemas com álcool ou drogas;
  • Prostituição
  • Masturbação excessiva, interação de cunho sexual com outras crianças;
  • A nível físico, irritações na boca, vagina ou ânus.

(Wallon, 1995)

As crianças nem sempre são protegidas por aqueles que lhes deveriam dar amor e proteção. Nem todos os pais, mães, primos, tios, avós, são seres humanos com capacidade de amparo, cuidado e carinho, e são os mais vulneráveis que acabam por sofrer as sequelas de uma vida adulta com baixa auto-estima, falta de confiança nas relações, inseguranças, ansiedade, e perturbações psicológicas, que por vezes só são aliviadas por psicoterapia intensiva.

Cabe-nos a todos nós, observadores conscientes deste mundo imperfeito, estar atentos aos sinais e sintomas e denunciar para proteger e prevenir futuros abusos, daqueles que podem vir a fazer deste mundo um lugar melhor!