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Inês Custódio

Inês Custódio

A ansiedade é já uma “amiga de longa data” que tomos conhecemos. Com vidas mais ou menos organizadas, mais velhos ou mais novos, aqui ou no outro lado do mundo, todos a conhecemos e todos a sentimos.

Em muitos momentos da nossa vida conseguimos reconhecer a sua utilidade enquanto emoção protetora e ativadora, mas muitas vezes não resistimos ao pensamento de que algo não regula bem com o termostato desta emoção e facilmente nos sentimos avassalados por ela. Nestes momentos, praguejamos contra a nossa natureza: afinal porque é que não existe um botão para desligar a ansiedade?

Para respondermos a esta pergunta, importa compreender como funciona a ansiedade e qual o papel que esta tem na nossa vida desde que existimos.

 

Um sistema de alarme avançado

 

Imaginemos o corpo como uma casa, como qualquer casa ele tem as suas fragilidades e está sujeito a todo o tipo de ameaças, mas em vez de fogos, assalto ou inundações, nós estamos sujeitos a perigos de vida, ataques de outras pessoas, rejeição, falha, entre muitos mais que a nossa cabeça possa encontrar… O que a nossa sociedade avançada encontrou para proteger uma casa dos perigos que possa sofrer, foi o sistema de alarme. E sempre que possível instalamos este sistema, com tudo o que possa defender o que é nosso. Também a nossa evolução “pensou” assim e colocou o melhor sistema de alarme que existe no nosso cérebro. Falamos do nosso sistema de ameaça, mais desenvolvido que qualquer alarme que possam inventar e que tem como principal sinal de alerta a ansiedade.

Tal como qualquer sistema de alarme tem sensores de movimento, deteção de entradas indevidas, ativação de sons de alarme para chamar por ajuda e afastar possíveis perigos, também o nosso organismo funciona da mesma maneira:

 

  1. Deteção de perigo. Os nossos sensores, sensíveis a qualquer ameaça são os nossos sentidos. Todos eles funcionam através da deteção de estímulos externos: cheiros que possam representar perigo (p.e. cheiro de fumo), sons mais ameaçadores (vamos desde o estrondo na rua, até à palavras pouco simpáticas do chefe), sensações (toques inesperados, dores), paladares desagradáveis (p.e. um alimento estragado) até à observação do mundo à nossa volta (alguém a correr na nossa direção, expressões faciais desagradáveis, um carro que não para na passadeira…). Mas como vai perceber todos estes sensores em si não serviriam de nada, não fosse o processo que se segue. Na maioria das vezes acabamos mesmo por nem nos dar conta do que os nossos sentidos apuraram do mundo, devido à forma tão rápida como tudo se processa.
  2. Avaliação do perigo. O nosso cérebro tem um único propósito: proteger-nos. Desta forma, tudo o que dá entrada através dos nossos sentidos é rapidamente avaliado como algo: neutro, positivo ou negativo. No caso do nosso sistema de ameaça, este ignora os estímulos neutros e positivos e será ativado pela deteção de estímulos negativos perigosos. No fundo a cabeça diz rapidamente “cuidado!”.
  3. Ativação do alarme. Mas só um pensamento ou uma avaliação não são suficientes e é neste momento que é ativada a ansiedade. Num sistema de alarme convencional ela corresponde à sirene que começa a tocar incessantemente, no nosso caso: aceleramento cardíaco, respirações rápidas, tensão muscular, sensação de calor, frio, mal-estar físico, indisposição abdominal, rubor, dificuldade em respirar… e várias sensações físicas, que começam a sinalizar no nossos corpo que algo de errado está a acontecer.
  4. Resposta ao perigo. É neste momento que no sistema de alarme da nossa casa, ligávamos às autoridades, digitávamos o código, chamávamos por ajuda… Mas no nosso organismo e no nosso cérebro o que acontece é ainda mais ativação. Rapidamente (tão rapidamente, que se torna difícil de acompanhar) o nosso cérebro prevê os piores cenários, quais as consequências previsíveis, como resolver a situação… habitualmente a resposta passaria por três soluções possíveis: lutar, fugir ou congelar (a tríade responsável pela sobrevivência da espécie humana).

Assim, perante um perigo real, qualquer uma destas soluções resolve a situação e a ansiedade irá descer automaticamente. Fizemos bom uso do nosso sistema de alerta e evitámos ser atropelados, fugimos de um conflito desnecessário, defendemos a nossa opinião, agimos para resolver um problema, preparámo-nos para fazer uma apresentação… no fundo, todas as situações que nos criam ansiedade e sobre as quais podemos agir, alterar ou resolver, terminam aqui. Sistema desativado, continuamos com a nossa vida!

  1. Mas há um 5º ponto… e é aqui que o nosso sistema de alarme tem os seus problemas. Lembre-se que ele foi desenhado desde o início das espécies (não só nos humanos) para resolver problemas externos (fugir de animais mais fortes, lutar contra opositores, fingir de morto…), mas com a evolução do nosso cérebro tendemos a utilizá-lo com questões internas, problemas sociais e sem solução aparente, no fundo começámos a identificar perigo onde, muitas vezes, ele não é visível. Imaginamos um perigo futuro, sentimo-nos ameaçados por algo que fizemos no passado, por vezes sentimo-nos até ameaçados pela pessoa que somos ou que gostaríamos de ser.

O que importa é que mais uma vez o cérebro diz “cuidado!” e damos por nós com, nada mais nada menos, que ansiedade!

Queríamos agir, queríamos alterar o que se passa, o que sentimos, mais uma vez queríamos digitar o código, chamar a polícia, afastar o perigo e não sentir mais assim. Mas quando o perigo é criado pela nossa cabeça, não há sítio para onde ir, nem muito a fazer, o sistema continua em alerta e não parece tarefa fácil conseguir desativá-lo.

 

Desanimado? Preocupado por a sua ansiedade não ter solução?

Não fique!

Vamos pensar um pouco sobre a situação: O nosso cérebro ativa a ferramenta e o sistema mais antigo que tem, porque é aquele que conhece, é aquele que nos habituámos a utilizar. Mas a vantagem de sermos humanos reside na capacidade infinita de adaptação e aprendizagem, por mais desafiante que seja podemos sempre a prender a tirar o melhor partido da nossa natureza e utilizá-la a nosso favor. Mas para isso, temos de refletir um pouco até percebermos que o sistema não muda e a ansiedade não vai desaparecer, resta mudar o que vamos fazer em seguida, resta mudar a estratégia.

Neste momento é já mais fácil para si identificar a sua ansiedade, terá de aprender a parar de lutar contra ela, a observar o motivo porque esta foi ativada e perceber quando é momento de agir ou de abrir mão, aceitando que a ansiedade pode estar, sem ter de lhe responder, sem deixar que esta defina quem é ou o que faz com a sua vida!

 

Difícil? Um pouco mas, definitivamente, possível!