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Autor: Vanessa Damásio


É daquelas pessoas que se levantam antes do amanhecer e nunca precisa de um despertador? Deitar cedo e cedo erguer é o seu lema? Ou será que preferia dormir até ao meio-dia se pudesse?

A maioria das pessoas tem algum grau de preferência ou por noites tardias ou por despertar de manhã bem cedo. A preferência de cada indivíduo determina em grande parte o seu cronotipo – disposição individual relativa ao tempo despendido para períodos de atividade ou de descanso. Alguns são claramente “cotovias” – madrugadores, enquanto outros são distintamente “corujas” – notívagos. O resto encontra-se em algum lugar intermédio, entre os dois extremos do espectro.

A tendências para “coruja” da noite ou para madrugador é movida em parte por significativas forças biológicas e genéticas. Diferentes cronotipos estão associados a variações genéticas, bem como a diferenças no estilo de vida, humor, disposição, função cognitiva e riscos para a saúde, incluindo distúrbios do sono e depressão.

Novas pesquisas encontraram evidências de diferenças físicas nos cérebros dos distintos cronotipos. Cientistas da Universidade de Aachen, na Alemanha, realizaram exames cerebrais em madrugadores, notívagos e cronotipos intermédios. E descobriram diferenças estruturais nos cérebros de pessoas com diferentes tendências de sono-vigília. Os investigadores observaram um grupo de 59 homens e mulheres de diferentes cronotipos: 16 eram madrugadores, 20 intermédios, e 23 eram notívagos. Estes últimos, em comparação com os que acordam cedo e os intermédios, apresentam uma redução na substância branca em várias áreas do cérebro. A matéria branca é um tecido adiposo que facilita a comunicação entre as células nervosas; uma reduzida matéria branca tem sido associada à depressão e a disrupções na função cognitiva normal. A causa da diferença na qualidade da substância branca não é clara. Contudo, os pesquisadores especulam que a diminuição da substância branca pode ser o resultado de “jet lag social” crónico, que caracteriza os efeitos das rotinas de sono-vigília de muitos notívagos. As pessoas que têm tendência a dormir até tarde muitas vezes encontram-se em desacordo com o cronograma constante da vida que os rodeia, particularmente no que concerne ao trabalho e aos horários escolares, que exigem iniciar-se de manhã cedo. Isto pode deixar os notívagos com uma privação crónica de sono, experienciado sintomas de fadiga, dificuldade para se concentrar, dor física e desconforto, semelhantes às do jet lag.

 A pesquisa indica então que as pessoas que ficam acordadas até tarde se encontram em maior risco de depressão. Outros estudos têm demonstrado que os notívagos são mais propensos a consumos significativos de tabaco e de álcool, bem como inclinados a comer mais e a dietas menos saudáveis ​que os que acordam cedo ou que as pessoas com padrões de sono intermédios.

Mas a pesquisa sobre a influência de cronotipo não traz só más notícias aos notívagos. Alguns estudos têm mostrado que as pessoas que dormem até tarde são mais produtivas que as que acordam cedo, e têm mais resistência ao longo dos seus dias. Outra pesquisa refere que as “corujas”/notívagos exibem maior capacidade de raciocínio e habilidades analíticas que as “cotovias” que se deitam mais cedo. A pesquisa reforça ainda que, em média, as “corujas” alcançam um maior sucesso financeiro e profissional que as “cotovias”. Este último estudo é o primeiro a fornecer evidências concretas de diferenças neurológicas entre pessoas com tendências do sono distintas. Neste sentido, podemos compreender que as inclinações para ficar a dormir até tarde ou acordar cedo estão profundamente enraizadas em diferenças biológicas e genéticas.

Cientistas descobriram um gene “despertador “, que ativa o relógio biológico do corpo. A identificação deste gene e a sua função pode, eventualmente, dar-nos novas e importantes informações sobre a influência do cronotipo e a função circadiana do sono na saúde.

Vários estudos envolvendo gémeos têm também demonstrado ligações genéticas de vários aspetos do sono, incluindo a temporalização circadiana e as preferências de sono/vigília.

As pesquisas também revelam diferenças na função metabólica cerebral entre os notívagos e quem acorda cedo. Estas diferenças metabólicas foram descobertas em regiões do cérebro envolvidas no humor, e podem ser uma razão pela qual os notívagos estão em maior risco de depressão relacionada com a insónia.

Um estudo recente mostra ainda que a limitação da exposição à luz artificial no período noturno e o aumento da exposição à luz solar durante o dia pode mudar os ciclos de sono-vigília, mesmo para os notívagos. Torna-se então importante criar fortes hábitos de sono, sendo cuidadoso com o consumo de álcool perto de deitar, regular as horas de adormecer e despertar, certificar-se de que o quarto é escuro e os aparelhos eletrónicos estão desligados, de forma a poder ajudar a reforçar o horário de sono, mesmo que não se alinhe perfeitamente com as suas tendências naturais.

De uma forma mais ampla, esperemos ver a sociedade a começar a reconhecer o poder destes padrões biológicos do sono, e a compreender a necessidade de flexibilidade que permita a construção de agendas de trabalho que se alinhem melhor com os distintos padrões de sono, para que a saúde mental de cada pessoa possa reequilibrar-se e estabilizar, de forma mais saudável, produtiva e feliz.

Bons sonhos corujas e cotovias!