Burnout e engagement: dois lados da mesma moeda?

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De acordo com o Relatório da Agência Europeia para Segurança e Saúde no Trabalho, publicado em 2014, na Europa 25% dos trabalhadores dizem sofrer de stress no trabalho durante a maior parte ou a totalidade do seu horário de trabalho, e uma percentagem semelhante relata que o trabalho afeta negativamente a sua saúde.

 

Mas será o stress sempre negativo e indesejável?

Apesar de, tradicionalmente, se considerarem sobretudo os aspectos negativos e disfuncionais associados ao processo de stress (distress), importa não esquecer o carácter incontornável, positivo e adaptativo que o mesmo pode assumir (eustress). O eustress corresponde a uma resposta positiva a um ou mais fatores de stress, assinalada pela presença de pensamentos e emoções positivos, ou seja, reflecte a medida em que uma situação ou acontecimento potencialmente geradores de stress podem ser vistos como oportunidades, benéficas ou potenciadoras do bem-estar individual e/ou coletivo. Para esse efeito, muito contribuirão as forças, as virtudes e os recursos individuais e coletivos.

 

O burnout está para o distress como o engagement está para o eustress?

O burnout, termo com origem no último terço do século XX, sendo resultado da exposição prolongada a fatores de stress de cariz profissional e da resposta crónica aos mesmos, é conhecido como síndrome de exaustão, física e emocional, conduzindo muito frequentemente a dificuldades físicas, psicológicas, emocionais e comportamentais.

Com o advento das correntes de pensamento subjacentes ao movimento da salutogénese (origem da saúde), num famigerado artigo publicado em 2002, Seligman e Csikszentmihalyi definiram a Psicologia Positiva como a ciência da experiência positiva subjectiva, dos traços individuais positivos e das instituições positivas. Assim, através do estudo das forças e das virtudes, por oposição ao determinismo vigente das fraquezas e do sofrimento, passaram a desenvolver-se estudos com vista a compreender como desenvolver qualidades, forças e recursos que permitam aos indivíduos enveredar por um caminho de desenvolvimento pessoal e profissional positivo e gratificante, passível de gerar bem-estar, contentamento, felicidade, compromisso e satisfação. Partindo deste quadro de referência, surge um novo conceito, o de engagement.

Diferentes autores referem que o burnout e o engagement podem ser considerados como fazendo parte de um contínuo de padrões de bem-estar individual, resultantes da manifestação de dois fatores principais, o do prazer e o da activação. Assim, o burnout caracteriza-se por níveis reduzidos de activação e de prazer, enquanto o engagement, por oposição, se encontra associado a níveis elevados de activação e de prazer. Nesta perspectiva, o engagement é definido como um estado afectivo-motivacional positivo e persistente, de realização dos indivíduos, caracterizado por vigor, dedicação e compromisso.

 

Engagement, produtividade e sucesso…

Intuitivamente, se um indivíduo encontrar um novo trabalho ou for promovido e obtiver mais dinheiro, será mais feliz no seu trabalho. O facto de nem sempre isso acontecer levou ao questionamento desta assumpção. Com a informação proveniente da psicologia positiva e das neurociências foi possível perceber uma tendência distinta. Na verdade, constatou-se que, quando um indivíduo se encontra mais feliz ou experimenta um estado afetivo positivo, essas características contribuem mais significativamente para o seu sucesso. Assim, o sucesso parece ser mais uma consequência do engagement do que o engagement uma consequência do sucesso.

Em termos científicos, quando experienciamos emoções positivas observamos um aumento nos níveis de serotonina e de dopamina, os quais constituem neurotransmissores, isto é, substâncias químicas libertadas pelas células nervosas com intuito de transmitir sinais a outras células nervosas. Estas substâncias não só nos proporcionam prazer como estimulam os nossos cérebros para a aprendizagem. Desse modo, o nosso cérebro adquire uma eficiência adicional em termos de organização, retenção e recuperação da informação. Paralelamente, assiste-se a um aumento na rapidez do raciocínio, na criatividade, na capacidade de olhar para as dificuldades de forma alternativa, aumentando a competência de resolução de problemas e de análise de informação complexa.

Em síntese, quando nos encontramos mais envolvidos e comprometidos com o trabalho, experimentamos mais emoções positivas o que, por sua vez, contribui para níveis mais elevados de produtividade e desempenho.

Considerando o que anteriormente se referiu, a descoberta e aplicação das nossas forças e recursos, permitem que sintamos maior satisfação e bem-estar relativamente a nós próprios, aos outros e ao mundo.

Assim, ainda que todas as pessoas apresentem características de funcionamento sentidas como dificuldades ou limitações, e não obstante a importância de as identificar, reconhecer e aceitar, para se atingirem estados de engagement torna-se prioritário o foco nos recursos e nas forças, bem como, o investimento para o desenvolvimento dos mesmos.

 

 

Mas afinal como posso saber quais as minhas forças e virtudes?

Deixamos, em seguida, algumas estratégias que poderão servir como pistas para responder a essa pergunta. Procure:

  • As pessoas que melhor o conhecem, e em quem mais confia, e pergunte-lhes acerca das suas maiores qualidade e virtudes;
  • Reparar nos aspetos em que habitualmente as pessoas o costumam reconhecer ou elogiar;
  • Perceber quais os aspetos da sua vida de que mais se orgulha;
  • Recordar em que competências ou tarefas costuma, habitualmente, ter maior facilidade de aprendizagem e níveis mais elevados de desempenho;
  • Estar atento aos pensamentos e às sensações do seu corpo, habitualmente associados aos momentos de maior prazer e realização;
  • Reconhecer os momentos em que, no desempenho das suas funções ou na realização de atividades de prazer (p.e. hobbies), se sente fluir, sem se aperceber que o tempo passa;
  • Estar atento às circunstâncias ou situações em que, por norma, se sente mais “você próprio”.

 

 

Lembre-se que, por mais difícil que lhe seja reconhecê-las, identificá-las ou recordá-las, todas as pessoas, sem excepção, dispõem de forças e recursos.

Ainda não se sente familiarizado com os mesmos? Tem-nos sentido distantes? Então, do que está a espera para os começar a (re)descobrir?!

Pedro Barbosa da Rocha
Pedro Barbosa da RochaPsicólogo Clínica
2018-05-11T09:14:19+01:0015 de Agosto, 2015|
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