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Falar sobre morte em PsicologiaA morte – horror de tantos – está entre os grandes universais da humanidade, constituindo-se em potência primitiva e, como tal, faz com que sejam construídas formas de expressão consensuais de maneira a gerar significações para que se possa lidar com ela.

Nos dias atuais, a morte não é encarada unicamente como um fenómeno instantâneo, mas sim um verdadeiro processo, não só biológico, como também psicossocial, em que um grande número de atos vitais se extinguem numa sequência tão gradual e saliente que escapa geralmente à simples observação, suscitando na maioria das pessoas intensas emoções (Castedo & Santos, 2008).

Poder-se-á afirmar que o ser humano, desde sempre, se preocupou com a sua existência e mais ainda com a sua finitude. Na realidade, acedemos mais claramente a essa ideia de finitude através da morte dos outros, sobretudo daqueles que nos são próximos e queridos. É, no entanto, muito também sobre a nossa própria morte que surgem as nossas angústias.

Num momento em que várias temáticas consideradas tabus começam a ser encaradas e desfragmentadas no tecido social (e.g. sexualidade, religião, e.t.c.), a morte assume-se ainda nos nossos dias como um tema que a sociedade continua a ignorar.

A morte parece pois hoje constituir-se do seu carácter mais selvagem e obscuro, uma vez que são acionados os maiores esforços no sentido de escondê-la, silenciá-la, ocultar toda a dor e sofrimento causado. Glaser & Strauss (1966, 1968 cit. in Barros, 1998), observam que nas sociedades industriais, o doente deixou de sentir a morte a chegar, uma vez que esses sinais são-lhe muitas vezes omitidos pelos profissionais de saúde e familiares, sendo também cometido o adiamento da morte nos hospitais havendo ainda uma grande resistência à medicina paliativa. De acordo Elias (2001, cit in Campelos, I., 2006), nos dias de hoje morre-se higienicamente e sem odores em hospitais, onde o comum é coordenar uma estruturação social para o evento de morrer. Assiste-se, portanto, e de acordo com Loureiro (2004) a uma institucionalização e medicalização da morte, o que significa que, por um lado, as famílias e a sociedade colocam nas instituições e nos profissionais de saúde a responsabilidade de tratar e cuidar dos doentes, sobretudo nos casos que envolvem doença terminal, por outro, evidencia um repositório de crenças nos profissionais de saúde como agentes privilegiados para lidar de forma eficaz com a saúde/doença dos indivíduos.

Sabendo que o medo da morte coexiste com o ser humano desde o seu nascimento, também as Ciências Psicológicas, nas últimas décadas, se têm interessado especialmente sobre a ansiedade e a angústia da morte, tanto a nível consciente como inconsciente, uma vez que tal medo vai condicionar e influenciar o indivíduo em termos da sua personalidade e do seu comportamento (Barros, 1998).

Uma vez que a morte e o morrer constituem-se como temas complexos, influenciando todas as dimensões humanas, é importante um debruçar complementar da Psicologia sobre os aspetos e impactos psicológicos da mesma no individuo, uma vez que fenómenos como o suicídio, o aborto, a eutanásia/distanásia, o luto, a solidão, determinadas doenças (e.g. sida, cancro, depressão), encontram não poucas vezes alguma configuração que sublinha um posicionamento perante a morte e o morrer, uma vez que lhes subjaz de alguma forma uma experiência de perda.

Este posicionamento perante a morte e o morrer leva, inevitavelmente, a uma consideração sobre a importância da educação para a morte (Barros, 1998), educação esta que, entenda-se, pressupõe um desenvolvimento pessoal que se baseie numa preparação para a morte, para situações que envolvem relacionamentos, perdas, situações-limite, como, por exemplo: fases do desenvolvimento, perda de pessoas significativas, doenças, acidentes, e até o confronto com a própria morte (Kovács, 2008).

“A aceitação da morte constitui certamente um dos maiores sinais de maturidade humana, daí a necessidade duma educação sobre a morte, duma “ars moriendi”, porque a morte, paradoxalmente, pode ensinar a viver.”

Oliveira (2002)

 

Autor: André Viegas