Será só impulsividade ou algo mais?

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Impulsividade ou algo mais?Quantas e quantas vezes os pacientes chegam ao consultório e afirmam que “não consigo controlar, sou assim! Sinto raiva e não sei porquê… Sei que exagero mas, quando vejo, já fiz” ou “mesmo quando o meu companheiro demonstra afecto não consigo sentir-me amada. Sei que gosta de mim, mas, não sei porquê, tenho medo de que me deixe…”.

Já ouviu falar de perturbação de personalidade borderline? As pessoas tendem a ser socialmente agradáveis, simpáticas e com uma conduta bastante adequada. No entanto, nas relações mais íntimas apresentam um padrão comportamental instável e pouco tolerante a situações frustrantes. Embora tenham consciência de que em certas situações agem de forma desadequada, têm enorme dificuldade em conseguir controlar o comportamento explosivo, sendo muito susceptíveis a “ataques de raiva” na tentativa de obrigar o outro a reconhecer a sua importância.

Por vezes, as vivências traumáticas (reais ou imaginadas) na infância poderão intensificar ainda mais a vulnerabilidade do comportamento borderline (luto, abandono, negligência, abuso sexual, tortura física e/ou psicológica), que começa a manifestar-se na adolescência e permanece até à idade adulta.

É recorrente nestas pessoas a necessidade quase agoniante de terem alguém sempre consigo para nunca se sentirem sozinhas ou desamparadas. Procuram a todo o custo evitar o abandono (real ou imaginado) daqueles que amam, exigindo continuamente demonstrações de afecto. Nas relações íntimas, embora sejam propensas a terem relacionamentos intensos, apresentam um padrão comportamental bastante instável, com oscilações de humor recorrentes. Verifica-se nestes casos a tendência para quadros depressivos, comportamentos impulsivos, ataques de ansiedade, irritabilidade, ciúme patológico, gastos irresponsáveis, sexo inseguro, condução imprudente, comer de forma compulsiva, adicção ao álcool, abuso de substâncias e comportamentos manipuladores como a hetero/auto-agressividade, ameaças ou tentativas de suicídio.

As relações tendem a ser problemáticas pela dicotomia entre a sensação de dependência do outro e a aparente crueldade com que tratam os pares (irmãos, pais, familiares próximos, amigos, companheiros, etc.). Pessoas com perturbação de personalidade borderline atacam para tentar camuflar a sensação de dependência do outro. Nas relações conjugais, exigem uma proximidade intensa que chega a ser considerada sufocante, mesmo quando a relação é recente. As demonstrações de afecto do outro nunca são suficientes e são vistas como desvalorização dos seus sentimentos. É como se o outro não se importasse com os seus sentimentos (mesmo que não seja a realidade).

O tratamento desta perturbação passa pelo uso de medicamentos estabilizadores de humor (para conter a impulsividade). No entanto, é imprescindível o acompanhamento psicoterapêutico, que poderá ser longo, pois visa a clarificação de questões distorcidas e de necessidades não satisfeitas ao longo de vários anos. Será imprescindível esclarecer e responsabilizar a pessoa por todos os seus comportamentos reactivos e instáveis; mostrar que reacções automáticas ao medo da perda são geralmente pouco racionais e adequadas. A aprendizagem de novas capacidades em termos de eficácia interpessoal e de regulação emocional são pontos-chave a serem trabalhados.

A recuperação é uma escolha e por isso a pessoa deve ter consciência do que pode fazer para se sentir melhor. No processo terapêutico irá ser ajudada a regular-se emocionalmente, promovendo a interiorização de ferramentas mais eficazes para o controlo de comportamentos impulsivos e desajustados. No entanto, a recuperação depende essencialmente daquilo que cada um está disposto a trabalhar.

Referências:
American Psychiatric Association. (1994), “Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders” (4th ed.). Washington, DC: Author.
Ballone GJ, Moura EC.

“Personalidade Borderline” in. PsiqWeb, Internet, disponível em http://virtualpsy.locaweb.com.br/www.psiqweb.med.br/, revisto em 2008.

Paula Brito
Paula BritoPsicóloga Clínica
2017-06-30T12:20:57+01:0019 de Setembro, 2014|
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