Autor: Inês Mota
Muitos casais que chegam à terapia de casal encontram-se “num ponto” onde sabem que a comunicação ou a conexão entre ambos se encontra muito deteriorada, sem no entanto saberem como chegaram ali, não conseguindo inclusive identificar esse “ponto”, espécie de buraco negro, para o qual parecem ser automaticamente sugados, no qual repetem infindavelmente o mesmo tipo de discussões. Igualmente, a escuridão é total relativamente a como poderão evitar o abismo.
Normalmente estes casais ficam prisioneiros de ciclos interativos negativos, que se estabelecem quando as necessidades individuais de valorização da identidade e auto-estima (“sinto que gostas de mim como sou”, “sinto que me aceitas”), ou da segurança relativamente ao laço afetivo que os une (“sinto que estamos conectados”), são sentidas como estando comprometidas. Desta forma, os elementos do casal podem não se sentir valorizados ou sentir-se abandonados, já que todos nós precisamos de validação para sentir estima, e de conexão e de proximidade para sentir segurança.
São diversos os ciclos negativos que se podem desenhar, consoante as “danças viciadas” estabelecidas em cada casal. Ficam os exemplos:
– Pode acontecer que quando um dos membros do casal se sente atacado na segurança do laço experimente um sentimento de solidão, e pode tender a atacar o outro no domínio da identidade, afirmando, por exemplo, “passa-se algo de errado contigo!”, o que faz com que o outro, por sua vez, também tenda a atacar no domínio da identidade, dizendo “eu estou bem, passa-se é algo de errado contigo”, e, ofendido, poderá fazer um movimento de retirada, culminando na solidão, o lugar que tanto se receava encontrar.
– Outra “valsa negra” acontece quando um dos membros do casal se sente sozinho, tentando procurar proximidade para regular a distância sentida, mas poderá fazê-lo de uma forma sentida como invasiva pelo outro, fazendo com que este procure definir os seus limites, evitando a proximidade.
Os ciclos negativos poderão ser vários, sendo que na terapia de casal o importante é reconhecer e identificar os loops específicos que se estabelecem em cada par e os buracos negros que o fazem entrar em loop; conseguir perceber também que, embora o loop seja agora destrutivo, em algum momento esteve ao serviço da reparação de necessidades sentidas. É igualmente importante para cada um dos membros do casal compreender que as necessidades sentidas acontecem dentro de cada um e muitas vezes são invisíveis para o outro, que apenas poderá satisfazê-las se as conhecer. No entanto, para tal acontecer, cada um terá de conhecer e conseguir expressar as suas vulnerabilidades. Poderá assim haver proximidade e proteção quando se percebe que o outro se sente sozinho, poderá haver movimento de valorização quando se percebe que o outro se sente inferiorizado. É ainda importante saber que estes lugares sombrios de solidão, desamparo ou vergonha são normalmente muito antigos, de marcas da infância ou do desenvolvimento, sendo que paira na interação do casal uma espécie de sensibilidade interativa a gatilhos externos que pressionam os gatilhos internos.
O desafio em terapia consiste em compreender o funcionamento e manutenção destes ciclos, primeiro fazendo com que o que se passa secretamente dentro de cada um deixe de ser um mistério para o próprio e passe também a ser um puzzle decifrável para o outro.
Em terapia existirá também um espaço seguro, onde se pode expressar a dor e a vulnerabilidade em relação a essas feridas e necessidades, e espaço para cada um aprender a sarar as feridas e a cuidar, validar, confirmar e reconhecer o outro.
Desta forma os casais aprenderão a evitar os passos pesados do passado, a dançar de forma mais leve e fluida, e a desenhar novos círculos de entendimento e de proximidade.