Conto terapêutico

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Conto terapêutico

A filosofia da Oficina de Psicologia entende que a psicoterapia deve ultrapassar os limites do consultório e os trâmites clássicos do diálogo. Para tal, a Oficina de Psicologia do Porto tem organizado várias atividades de dinamização, com vista em melhorar o bem-estar dos seus participantes e como forma de prevenção da saúde mental. Entre elas destaca-se a última atividade “Conto terapêutico”, realizado dentro das comemorações do 1º aniversário da associação Bairro dos Livros, no dia 13 de Abril de 2013.

O Bairro dos Livros é um evento cultural promovido pela CulturePrint, destinado a promover a leitura e a celebração dos livros e dos seus autores.

Aqui, a Oficina de Psicologia desafiou os participantes a criarem um conto a partir de palavras que as representassem (objetos, ações, adjetivos, emoções, …). Estas palavras teriam de estar incluídas ao longo do texto, que foi feito por todos os elementos em conjunto, e foram as seguintes:

 

África, família, Porto, livros, amigos, água, olhos, cantar, imagem, simbiose, fotografia, vermelho, ansiedade, margens, rios, mãos, correr, Moçambique, beijo, andar, saudade, azul, amor, flores, torre, carinho, dançar, negro, cinema, branco, música, bibliotecas, cinza, insegurança, pular, lábios, inventar, calma, arte, palavras, ouro, sons, crianças, história, mar, cor, árvore, sorrir, luz, sol, terra, cheiro, lilás, natureza, verde e papel.

O resultado desta atividade segue abaixo e é uma demonstração da capacidade criativa e de partilha das pessoas que participaram. No final da atividade, os participantes demonstraram-se muito satisfeitos, apenas dizendo: “Quando é que repetimos?”. E a OP Porto não vai deixar de responder a este pedido.

Conto:

“Um dia destes, em África, pareceu-me passar por ti…

Lembrei-me dos teus olhos de água cravada na terra e no cheiro de todos os rios. Lembraste-me os dias em que, empoleirados num escadote da biblioteca, conseguíamos finalmente retirar aquele livro: um amontoado de páginas de fotografias doces que guardaste no bolso da tua criança.

Nessas fotografias cantavas e dançavas sem inseguranças. Trazias bolsos atafulhados de cordéis, pedrinhas e pedacinhos de papel lilás. De pouco mais precisavas para inventar o mundo. Até porque um pedacinho do teu mundo te bailava já na mente, estava desde já semi-criado.

Na palma das tuas mãos, tantas vezes entrelaçadas nas minhas, voltaste ao leito dos teus rios, a Moçambique, à família, e ao Porto que te levou nos braços…

Pois, aqui estou eu, nos braços do Porto, com saudades de ti e das tuas cores e cheiros africanos.

Ainda que não gostes dos contrastes cinza e branco do Porto e prefiras o azul do mar, a verdade é que andar pela cidade, beber da sua história, me leva a dimensões de amor inexplicáveis. Aqui também nasce sol. Todos os dias…

 

Numa simbiose perfeita reunimos a tribo e damos as mãos a todos os amigos… Imagens instantâneas de carinho e muitos sorrisos. Mas pulava imediatamente para as margens do teu abraço! Ecrã perfeito de um cinema gigantesco e irreversível, onde salta à vista o vermelho quente do teu afeto.

Integro a natureza da minha cidade nas imagens de palavras com que me aqueces a caixa do correio da alma.

Na ansiedade de um beijo, selamos pestanas, concretizando a arte de amar. Lábios entreabertos que nos afastam do negro, trazendo-nos de volta à calma de outrora.

Corre de volta para mim.

Espero por ti protegido pela copa de uma árvore. Em África ou no acinzentado granítico do Porto. Basta que seja verde e estejamos descalços. Esta é, sem sombra de dúvida, a nossa torre, castelo de ouro fortificado de amor e flores, para onde queremos correr. Sons e letras com os quais resolvemos mais um dia. Da melhor forma, escreves no papel a nossa história…

Há um adeus que não aceitamos!

No fundo, sabemos que ao ocaso do dia aqui estaremos de novo. Vem daí…”

 

Cláudia Oliveira Almeida
Cláudia Oliveira AlmeidaPsicóloga Clínica
2017-03-17T11:36:06+00:0018 de Abril, 2013|
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