Autor: Inês Carvalho
Em tempos de rotinas cada vez mais complicadas de gerir, tem-se verificado – não poucas vezes – a passagem de períodos de tempo cada vez mais alargados dos netos com os seus avós. Tradicionalmente vista como uma relação de cuidado, de transmissão de afeto e de partilha de memórias e histórias familiares, a relação de avós e netos enfrenta, agora, novos desafios.
São pais com horários de trabalho cada vez mais exigentes e, frequentemente, difíceis de conciliar com o momento de ir buscar as crianças à escola e passar com elas o resto do dia. Pais preocupados com a manutenção da estabilidade económica da família e com a garantia de um futuro estável para os seus filhos. São avós com uma vida cada vez mais ativa, também eles preocupados com o bem-estar dos seus filhos e netos. Avós com um aspeto mais jovem, mas que entram numa fase diferente do ciclo de vida.
Em tempos outros, o papel de educadores ficava a cargo dos pais. Os momentos passados com os avós eram esses tais momentos lúdicos, repletos de brincadeiras e nos quais até podiam ser quebradas algumas regras e rotinas. O estabelecimento de regras e limites era maioritariamente feito pelos pais, ao passo que os avós podiam sentir-se mais ‘despreocupados’ e, em alguns momentos, permitir aos netos alguns comportamentos que nunca permitiram aos filhos.
Entretanto, aparecem avós confusos, preocupados, e até cansados… Avós que são pais outra vez?
Aparecem netos, também eles confusos e perdidos… Alguns com comportamentos agressivos e de oposição, alguns com alterações repentinas de humor. Damos conta de um estado confusional na criança, como que à procura de um ponto de referência que permita ao seu cérebro desenvolver-se de forma estruturada: “Quem estabelece os limites? Quem conta a história da família?…”
Talvez haja, agora, um novo desafio na relação de avós e netos. Agora, é preciso procurar um equilíbrio fino entre os espaços de afeto, de brincadeira e de estabelecimento de regras e limites. Mas, talvez o desafio seja, também, manter presente a capacidade de conservar o papel de avós tal como o descrevemos no início deste texto. Desafio exigente, percebemos isso…
Então, sempre que este cansaço se instale, e logo depois surjam as dúvidas, há alguns aspetos nos quais podemos pensar:
– É natural sentir cansaço e ter dúvidas, tal como errar é humano. É importante respeitar esses momentos de cansaço e de dúvida para que, depois, possamos sentir-nos disponíveis.
– Todos os momentos em que nos dedicamos genuinamente e de forma plena à criança serão importantes. Importantes para o seu desenvolvimento, mas também para o desenvolvimento desta relação singular entre avós e netos.