Tempo de Leitura: 3 min
Gustavo Pedrosa

Gustavo Pedrosa

Quando o seu filho chega a casa, depois de um jogo de futebol, qual a primeira pergunta que lhe faz? “Ganhaste?” ou algo mais focado nele próprio, por exemplo, “Divertiste-te?”?

As famílias tendem a criar nos mais novos uma atitude de competição e de motivação, muitas vezes focada apenas nos resultados e não do gozo da actividade desportiva em si. Alguns pais tentam viver alguns dos seus sonhos desportivos pessoais através dos filhos, o que vem aumentar essa pressão pelos resultados. Mas a família de um atleta que se prepara para a alta competição terá que se adaptar a essa realidade, pois o Desporto de alta competição exige uma família, também ela, de topo.

Os atletas de alta competição são, em diversos momentos das suas vidas, afastados das suas famílias e dos seus contactos sociais fora dos clubes, com o objectivo de treinar e dedicar uma boa parte da sua vida a melhorar o seu desempenho desportivo.

São frequentes os casos em que, ainda crianças, são afastadas também da escola e amigos para começarem a sua carreira desportiva. Chegam a um alto nível competitivo muitas vezes integrados em clubes e academias desde idades em que as suas próprias identidade, personalidade, valores e referenciais ainda não estão completamente definidos. Criam-se assim identidades meramente desportivas, com valores e motivações muito ligados aos resultados, ao bom desempenho desportivo, e à carreira. A atitude competitiva é criada e alimentada, paralelamente à perda de referenciais familiares e sociais fora da actividade desportiva.

Os objectivos e motivações dos jogadores são, assim, criados por pessoas de referência desportiva (ex: treinadores), pelos resultados, ou até pelos prémios monetários associados, tendendo-se a criar um foco de motivação exclusivamente externo ao atleta. Assim, mais tarde, nem sempre conseguem iniciar ou replicar, numa situação não-desportiva, os mesmos processos de motivação, empenho e de procura de resultados. Como tal, a sua motivação, na maioria das vezes apenas focada no processo competitivo, mais tarde não consegue ser aplicada noutras carreiras, levando a sensações de falhanço, desamparo e desconhecimento por parte do ex-atleta.

Actualmente as academias e clubes começam a dar mais atenção ao acompanhamento escolar e familiar durante a formação desportiva, com uma abordagem mais humana e com criação doutros focos motivacionais. Tentam-se criar outros hobbies e actividades que sejam também fontes de interesse e prazer.

As redes sociais devem ser alagadas além do meio desportivo e, principalmente, do clube. É frequente que, no fim da carreira desportiva, o atleta verifique que a sua rede de contactos sociais estão, muitas vezes, ligados ao clube onde está inserido.

Percebe-se assim que nos atletas de alta competição a família tem um papel fundamental. Além de manter-se como referência dos contactos sociais, é importante para manter outras actividades ou hobbies em paralelo. Isso evitará que, no futuro, quando o atleta terminar a sua curta carreira desportiva, consiga manter outros interesses ou capacidades de desenvolver outra actividade produtiva.

Aqui entra também a formação económica. Muitos dos atletas que terminam a carreira, ao fim de poucos anos, estão a passar por graves dificuldades financeiras. Não é fácil para os jovens atletas não se deslumbrarem com as capacidades financeiras que conseguem em tão curto espaço de tempo. E aqui entra, uma vez mais, a família. Alem das academias desportivas, também a família deverá ajudar o jovem atleta na gestão do seu capital.

A carreira desportiva deverá ser vista como esporádica, de curta duração. Deveremos ter presente que apenas uma pequena percentagem dos praticantes consegue ser bem sucedido por um longo período de tempo e que o nível de vida, em termos económicos, não poderá ser mantido por muitos anos. Em anexo à formação e carreira desportiva, deverão ser também desenvolvidos outros interesses e outras capacidades para que, no futuro, possam servir de base para uma nova carreira. E aí a família deverá ser fonte de estabilidade, conhecimento, sensatez, segurança e bem-estar.