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O último relatório de Segurança Interna, referente a 2010, regista um nº assustador de 1.133 crimes por dia (47 por hora…). Destes, 23% são contra pessoas. Se adicionarmos os números de sinistralidade rodoviária, cerca de 100 por dia, e assumirmos que 30% das pessoas directamente afectadas, por uma ou outra questão, terão sequelas psico-traumáticas, ou seja, que exibirão um qualquer impacto no seu bem-estar e qualidade de vida, no decorrer da vivência de um destes incidentes, chegamos a um nº que representa 0.4% da população portuguesa a padecer de trauma anualmente…

Números tão assustadores quanto o facto de ignorarem todos os outros factores potenciais frequentes de trauma: abuso físico e sexual não reportado, trauma médico e hospitalar, luto traumático, todas as situações que “poderiam ter sido mas não foram”, despedimento, o que se estima como um elevado volume de violência doméstica não reportada, humilhação pública, interrupção de gravidez, insucesso escolar ou profissional, trauma por ter testemunhado o trauma alheio… É impossível estimar a percentagem da população que anualmente – diariamente! – fica afectada, com sérios impactos na sua qualidade de vida, por um qualquer acontecimento que o organismo registou como traumático. Talvez 5%, 10%?

Só com base em psico-traumatologia, para já não falar de todas as restantes perturbações da categoria da ansiedade e do humor (depressão, bipolaridade), é fácil perceber a elevada necessidade de boas infra-estruturas em saúde mental. E no entanto, são praticamente inexistentes, de uma forma articulada, acessível e de qualidade, ao nível público, o que cria um vazio em Portugal ao nível das respostas efectivas de tratamento acessíveis a toda a população.

Recordamos as categorias tradicionais de sintomas de perturbação de pós-stress traumático (e que não incluem toda a gama possível de reacção disfuncional a um acontecimento traumático):

  • Experiência repetida e persistente do acontecimento traumático

Através de pesadelos, ou a sensação de estar a reviver a situação como se esta estivesse a decorrer no momento actual. Pode ainda acontecer que estímulos que fizeram parte da situação traumática criem uma elevada ansiedade e intrusão de recordações vívidas.

  • Evitamento persistente dos estímulos associados com o trauma, e embotamento da reactividade geral

A pessoa esforça-se por evitar pensamentos, situações, conversas que a recordem do acontecimento. Além disso, surge uma certa anestesia emocional, em que a pessoa se sente desligada ou alheada dos outros e de emoções em geral, o que leva frequentemente a diagnósticos de depressão.

  • Evidência de sintomas persistentes de activação nervosa, que não existiam antes da situação traumática

Podem surgir, por exemplo, problemas de sono, um estado de alerta constante, instabilidade emocional, irritação fácil, dificuldades de concentração e na conclusão de tarefas, dor medicamente inexplicável.

 

A sintomatologia traumática dificilmente se trata com medicamentos – a psicofarmacologia ajuda na redução dos sintomas, a curto prazo, mas não é solução como forma de resolver cabalmente e de modo duradouro a reacção que o organismo fez a um acontecimento sentido como traumatizante. Além disso, desperdiçam-se anos de tratamento erróneo, uma vez que os sintomas referentes a trauma são frequentemente mal diagnosticados como depressão ou ansiedade, não sendo o problema de trauma devidamente tratado. Para a própria pessoa que sofre também não é claro que aquilo de que se queixa está directamente relacionado com um acontecimento traumático de vida, sobretudo porque o organismo apenas reage, frequentemente, algum tempo após o acontecimento: semanas, meses ou mesmo anos.

A abordagem EMDR é considerada por grandes entidades reguladoras da saúde mental internacional como uma das intervenções mais eficazes em trauma: à sua eficácia no real tratamento (ou seja, os ganhos após a intervenção mantêm-se, permitindo-nos falar de resolução ou cura), soma-se a rapidez com que permite obter resultados positivos, por comparação com as abordagens mais tradicionais. Além disso, sendo o EMDR uma intervenção que dispensa diagnósticos, em larga medida, por depender de uma lógica interna do próprio organismo e do sistema de memória de cada pessoa, ainda que as queixas de quem procura um profissional de saúde não sejam evidentes como estando na sequência de trauma, ao longo do trabalho isto torna-se aparente permitindo o seu trabalho.

Na altura do acontecimento traumático, as emoções fortes que daí derivam interferem com a capacidade para processar (“digerir”) completamente a experiência fazendo-a ficar internamente parada no tempo. Envolvendo diversos elementos, o EMDR permite, com apoio de uma estimulação bilateral (ocular, auditiva ou por toque), facilitar o processamento destas memórias disfuncionalmente arquivadas, repondo o estado de equilíbrio psicológico de uma forma rápida, provavelmente afectando as redes neuronais associativas onde as memórias ficaram integradas. Ao facilitar o acesso e processamento das memórias traumáticas, reorganizando-as de uma forma mais adaptada, cria-se a distância e perspectiva a que estamos habituados para todas as nossas recordações de experiências de vida.

É, por tudo isto, uma das escolhas mais evidentes de tratamento em situação de psico-traumatologia. Infelizmente, em Portugal, apenas cerca de 150/200 profissionais de saúde mental têm formação específica que os habilite a este tipo de intervenções, o que apenas se pode explicar à luz do desconhecimento sobre o tema.

Na Oficina de Psicologia promovemos regularmente formações de elevada qualidade em EMDR, abertas a qualquer profissional de saúde mental, além de supervisionarmos a actividade clínica nesta área de quem o pretenda, contribuindo, assim, para a divulgação desta importante ferramenta terapêutica.

Todos os psicólogos da Oficina de Psicologia estão habilitados a intervir em EMDR, fazendo-o rotineiramente como parte integrante da sua actividade psicoterapêutica e quadro de referências teórico o que, tendo em conta o posicionamento de preços, de acordo com a sua missão de contributo social, torna possível chegar a uma elevada percentagem da população e oferecer uma alternativa real, eficaz e acessível de tratamento em contexto de trauma.