“O que queres ser quando fores grande?”
“Absurdamente feliz!”
A educação é sem dúvida dos maiores pilares no processo de se ser pessoa. E é precisamente como pessoa (e também como psicóloga na minha prática profissional) que tenho reconhecido os benefícios da meditação – a atitude e forma de estar na vida, de atenção plena ao momento presente, a capacidade de observação de nós próprios, de distanciamento e desidentificação com os pensamentos e as emoções – em lidar com o stress, a ansiedade, a depressão, o controlo dos impulsos e o autoconhecimento.
Distanciamento e desidentificação com os pensamentos e as emoções significam sentir que somos muito mais que eles, que não somos “a” emoção, que não somos “este” ou “aquele” pensamento, mas que eles apenas habitam e alugam a nossa mente por momentos.
E é como psicóloga que (também) trabalhou em escolas que vou refletindo desde há muito tempo no quanto estas deveriam ser um local privilegiado de desenvolvimento total, integral, holístico do ser humano (e ainda não o são).
O sistema educativo tem-se focado, essencialmente, no desenvolvimento de uma parte do ser humano: o raciocínio lógico, a linguagem, o conhecimento factual e enciclopédico, com currículos que apelam desta forma, e sobretudo, à estimulação e desenvolvimento de áreas cerebrais que se localizam no hemisfério esquerdo – típico do que tem sido o desenvolvimento da cultura ocidental. Isto cria um desequilíbrio óbvio, uma disparidade entre a atenção, a importância que se atribui ao desenvolvimento de competências que dependem do bom funcionamento e estimulação apenas de um dos lados do principal órgão humano.
Contudo, se pararmos um pouco para pensar, não nos parece possível que o ser humano possa viver sem o hemisfério direito, e a verdade é que as competências que dependem do seu bom funcionamento não são igualmente tidas em conta aquando do desenvolvimento dos currículos escolares, antes são claramente subestimadas! O que temos depois são seres humanos muito instruídos e pouco equilibrados e felizes. E temos crianças e adolescentes com problemas de comportamento e controlo dos impulsos, perturbações de ansiedade, de hiperatividade e défice de atenção; consumo altíssimo de medicação psiquiátrica quando o ser humano ainda está em formação!
Além disso, e não querendo partir para nenhum juízo de valor errado, ao longo dos vários anos de escolaridade obrigatória não se estuda (realmente) o principal órgão do corpo humano – o cérebro! Não se estuda de forma clara a sua fisiologia, a forma de funcionamento, à semelhança do que se ensina/estuda acerca dos outros órgãos do corpo humano. Este conhecimento é fundamental e pode (deve!) ser passado a qualquer criança ou adolescente, adequando-se os conteúdos à melhor forma de se transmitir essa informação, que a ser usada em benefício de si próprio e dos outros, deixa de ser informação para passar a ser conhecimento, sabedoria!
Parece-me urgente que as lideranças compreendam isto e que se contemple esta vertente da aprendizagem e do conhecimento junto das crianças e jovens; que acerca do cérebro humano se aprenda a sua forma de funcionamento e a influência do seu (dis)funcionamento nas nossas vidas. Assim como é importante que se pressuponha o ensinamento e práticas de meditação e/ou o desenvolvimento de uma atitude de atenção plena (mindfulness), e outras técnicas similares, como forma de estimular o seu ótimo funcionamento integral. Desta forma promovemos estados emocionais mais saudáveis, maiores níveis de atenção/concentração, menores níveis de ansiedade, de stress, melhor autocontrolo dos impulsos baixando a agressividade nas suas relações pessoais (dentro e fora da escola).
Se pararmos um pouco para refletir, ao longo de toda a nossa vida aprendemos/ensinam-nos a ser bons profissionais, ensinam-nos a esforçarmo-nos para tal, aprendemos a dedicar muito do nosso tempo diário a atingir esse nível de conhecimentos e experiência que nos tornam excelentes profissionais e pessoas de sucesso. Quando chegamos a adultos passamos essa mesma mensagem enquanto educadores…
…E os outros papéis que desempenhamos enquanto seres humanos ao longo da vida? Quanto tempo do nosso dia, à semelhança do que fazemos para o nosso papel de profissionais, dedicamos de forma consciente a sermos bons companheiros, bons filhos, bons amigos, bons irmãos, bons pais… boas pessoas? Para isso é importantíssimo o autoconhecimento – este é o primeiro passo. Também são precisos muito trabalho e desenvolvimento consciente de determinadas competências, com o mesmo empenho e comprometimento com que nos dedicamos ao desenvolvimento das competências profissionais.
Uma vez que é para nós importante a apreensão do mundo através do método científico (embora este não seja a única forma que temos de apreender e conhecer o mundo, de o pensar e sentir), podemos questionar porque é que o ser adulto, com responsabilidades e poder de governação, continua a apostar num modelo de desenvolvimento e de educação envelhecido, em negação de evidências (científicas, então…) que existem, cada vez mais, sobre a importância e os benefícios destas aprendizagens e abordagens… E os anos passam e por vezes até se regride neste caminho.
Convém que sejamos adultos que, além de saber ler e escrever na perfeição e com elevado nível de raciocínio lógico-matemático, saibam SENTIR e VIVER em relação (connosco e com os outros), felizes! Não é esse o derradeiro objetivo, afinal?
Enquanto esse nível de consciência e ação concreta não são tomados pelas lideranças, levando a uma reformulação do sistema educativo (e do sistema social em geral), precisamos nós, enquanto pessoas adultas e educadores, de o fazer no dia a dia, conduzindo as nossas práticas educativas neste sentido, para que haja equilíbrio no desenvolvimento cerebral das nossas crianças e adolescentes. Isto vai traduzir-se, invariavelmente, em adultos – pessoas – muito mais felizes que, por conseguinte, farão parte de uma sociedade muito mais equilibrada!
Quando perguntarem ao seu filho “o que queres ser quando fores grande?”, deseje (intensamente) que ele responda “absurdamente feliz!”.