Muito se fala atualmente sobre sintomas de desatenção (ou déficit de atenção) em crianças. Trata-se de um estado em que os pequenos parecem não conseguir focar-se em uma mesma atividade durante muito tempo, mudando de foco com frequência. Algumas crianças com sintomas de desatenção podem começar a executar uma tarefa (o “para casa”, por exemplo), e de repente esquecer-se da tarefa por qualquer outro evento irrelevante para a maioria de nós. O evento irrelevante pode ser também, um pensamento, que a leva a tornar-se alheia ao mundo, parecendo estar “no mundo da lua”. Por outro lado, estas mesmas crianças que se distraem com uma pequena mosca vista da janela, podem ficar tão concentradas nos eventos de seu interesse que não percebem mesmo o estrondo de uma cadeira caindo bem a seu lado. Tal perfil leva muitas pessoas a considerar que trata-se apenas de uma questão de escolha do que prestar atenção, mas a coisa não é bem assim.
Em primeiro lugar, é preciso compreender que a atenção pode ser classificada em diferentes tipos, tais como:
atenção concentrada, associada à nossa capacidade de concentração em um único assunto ou tarefa, como ao ler um livro, por exemplo;
atenção alternada, ocorre, por exemplo, quando você responde a mensagens no celular ao mesmo tempo que conversa pessoalmente com alguém, ou seja, quando mudamos de foco de atenção de tempos em tempos;
atenção seletiva, que trata-se de nossa capacidade de selecionar, dentre vários estímulos, aquele que interessa no momento, por exemplo, quando precisamos encontrar uma lata de doce de leite na prateleira do supermercado, onde há várias outras latas e doces.
Em nosso dia a dia utilizamos todos os tipos de atenção e mudamos de tipo de acordo com a demanda do ambiente. Isto significa que, se estiver em um supermercado escolhendo as compras lançarei mão da atenção seletiva, mas ao chegar à fila do caixa posso aproveitar, enquanto espero, para responder a alguns e-mails no celular, alternando a atenção entre o andamento da fila e minhas mensagens. Ao chegar em casa, após as compras, posso optar por ler um livro, e manter minha atenção concentrada para não perder a estória.
Uma criança desatenta pode apresentar dificuldades em modular estes vários tipos de atenção, podendo perseverar e um dos tipos ou utilizar o “tipo errado” ao executar suas atividades do dia a dia. Vejamos um exemplo: imagine uma criança desatenta cujos pais pediram que fosse à padaria comprar 5 pães e uma caixa de leite, e que no caminho aproveitasse para deixar o irmão mais novo na casa da avó. Parece relativamente simples, mas para executar esta tarefa ele precisaria ter se concentrado no momento de receber as instruções (atenção concentrada), sem distrair-se com outros estímulos externos e nem mesmo com seus pensamentos; posteriormente, deveria ser capaz de alternar a atenção entre atividades como: o caminho que deve seguir, conversar com a avó e pessoas que possa encontrar pelo caminho, atravessar a rua, além de observar o irmão enquanto o leva. Ao chegar à padaria será necessário selecionar o setor em que deve ir e os produtos que precisa pegar. É fácil imaginar que uma criança desatenta provavelmente deixará de executar alguma das tarefas e que dificilmente chegará em casa com todos os itens solicitados.
Para um indivíduo sem problemas de atenção a modulação da atenção ocorre de maneira automática, sem grande gasto de energia. Já para uma criança desatenta, tal modulação parece deficitária, o que torna muito difícil que ela decida qual é o melhor tipo de atenção a ser empregado. E frequente, por exemplo, no caso relatado acima, que ela faça uso de atenção alternada durante as instruções dos pais, prestando atenção em outras coisas – como o desenho na TV – ao mesmo tempo em que ouve sobre o que deve fazer. Ao perder a concentração, pode ter dificuldades para se lembrar de todas as tarefas. Ao ir para a rua, a caminho da padaria, pode distrair-se com uma revista na banca e ficar por lá, concentrada em seus assuntos de interesse, a ponto de esquecer-se de prestar atenção ao irmão, que atravessa a rua sozinho, correndo riscos. O mesmo pode ocorrer no momento de selecionar os pães e leite na padaria. Ao ver aquele doce que tanto gosta ou encontrar um amigo, pode acabar por pegar uma caixa de suco ao invés de leite e receber uma boa bronca ao chegar em casa!
O importante, nestes casos, é analisar se tais dificuldades são tão frequentes e intensas que prejudicam a adaptação e segurança da criança em seu dia a dia. Em caso positivo, pode ser indicado que ela passe por um processo de avaliação psicológica e médica a fim de identificar as melhores estratégias para auxilia-la na criação de estratégias para lidar com essas dificuldades. Nestes casos, pode ser necessária a intervenção psicoterápica e capacitação dos pais para que possam também auxiliar a criança em suas dificuldades. Em alguns casos, associada às práticas psicoterápicas e de capacitação de pais pode ser necessário o uso de medicação.
A avaliação e intervenção apropriadas podem poupar a criança e seus familiares de estresse e sofrimento desnecessários!
Autora: Renata Saldanha
Otimo artigo. Por mais que alguns condenem o diagnóstico de TDAH este transtorno pode sim prejudicar uma criança em seus estudos e atividades do dia a dia. Basta não exager e pedir ao medico medicação para hiperatividade quando na realidade os pais não estão conseguindo lidar com caracteristicas normais da infancia.