Autor: Vera Martins
Há dias uma cliente surpreendeu-me com uma nova relação afectiva – tinha feito amizade, sincera e baseada no respeito, com a sua ansiedade!
Confesso que quando começou por me dizer que tinha feito “amizade com a ansiedade”, fiquei entre a surpresa, a curiosidade e a preocupação… Esperei então que me explicasse o que queria dizer e o que tinha acontecido. Nos últimos tempos, andávamos a trabalhar sobre um tipo de ansiedade que a cliente sentia como desgastante porque lhe tirava a possibilidade de usufruir de coisas boas como viajar, pois ficava muito ansiosa e com medo que lhe acontecesse algo ou que houvesse algum problema com o filho quando estava separada dele.
Explicou-me então que num dia de sol ia a caminhar junto ao rio, a sentir-se deliciada com a paisagem, a temperatura e a luminosidade agradável, quando percebeu algo muito importante: “Só consigo apreciar toda esta maravilha precisamente porque sinto ansiedade! É o medo de morrer, o medo de que haja algum problema que me permite usufruir de momentos de beleza e de bem -estar. Pensei: é claro, só tenho medo de morrer porque estar aqui e usufruir da beleza da vida é mesmo bom! Mas sei que é verdade que um dia não estarei cá. E porque quero que o meu filho esteja bem para também apreciar isto tudo… fico ansiosa com a ideia de que algo pode correr mal. E quando vejo que algo está a correr bem e estou a viver coisas boas, dou mesmo muito valor e aprecio ao máximo…”.
Senti que esta cliente tinha percebido e, mais do que isso, tinha sentido algo de muito importante sobre as suas emoções e a função que estas cumprem na nossa vida.
É verdade que a nossa vida emocional se joga entre estes pólos mais ou menos acentuados de medo/insegurança e prazer/segurança, e é importante aceitar a importância de ambos na nossa vida e no nosso desenvolvimento enquanto pessoas. Aquilo que habitualmente fazemos é tentar fugir do medo e da insegurança, mas se conseguíssemos isso estaríamos a viver em desequilíbrio interno.
Não há dúvidas de que todas as emoções são importantes e cumprem funções psicofisiológicas determinantes de protecção e equilíbrio emocional.
Quis partilhar convosco esta pequena história de uma cliente em psicoterapia pois, na altura, tive mesmo vontade de, tal como o nosso saudoso Fernando Peça, dizer: “E esta, hein?”.