Muitas vezes aparecem adultos em consultório a questionarem-se se não sofrem de Perturbação de Hiperatividade e Défice de Atenção (PHDA), dada a incapacidade de conseguirem manter a atenção sustentada, terminarem tarefas e concluir objectivos, permanecendo numa roda viva, com grande gasto energético mas sem sentimento de realização e conclusão. Algumas vezes verifica-se mesmo uma desordem ao nível da atenção, mas muito mais vezes verificam-se outros múltiplos factores em que alguns sintomas se cruzam com a PHDA, mas que apenas existem há relativamente pouco tempo e apenas na vida adulta, o que não confere diagnóstico de PHDA, dado que é uma perturbação de desenvolvimento neurofisiológico, congénita. Muitas vezes o que interfere na incapacidade de suster a atenção é a procrastinação, a dificuldade da regulação de emoções, ansiedade não gerida de forma adequada, o que tudo leva a uma irrequietude e a dificuldades em manter a atenção focada. E tudo isto com a grande “ajuda” dos inúmeros estímulos que temos nos tempos atuais, sempre a distância curta, de fácil acesso e cada vez menos capacidade de negação: a vida online.
Os estímulos que corroem a atenção
Sabia que a média que um adulto despende em internet são de 3 horas diárias? É quase um part-time. Todo este tempo gasto em dispositivos digitais leva ao efeito que David Ley chama de “cérebro pipoca”. Com o cérebro pipoca, a mente está tão habituada a multitarefas de alta rapidez e sempre imediatos, que depois a vida offline, num ritmo muito mais lento, é aborrecida e enfadonha, e por isso a procura sempre de novos estímulos. Claro que ver vídeos de 10 segundos, estimulantes, engraçados e alguns até interessantes até passar ao próximo, é muito mais estimulante do que ler, em que cada linha demora 10 segundos e nunca mais se chega ao final das 320 páginas…
A capacidade de estar, de não ter respostas imediatas, de resolver, de pensar é, aparentemente, cada vez mais difícil. Um estudo na China verificou que a estrutura cerebral dos jovens com perturbação de dependência de internet comparada com jovens que tinham um uso de menos de 2 horas de internet é diferente, com menos volume de massa cinzenta no córtex pré-frontal dorso lateral bilateral, região cerebral que está associada a pensamentos complexo, expressão de personalidade.
Parece que o mau uso da Internet nos está a roubar massa cinzenta, e anos de vida. Herber Simon, laureado com prémio Nobel, cunhou o termo “economia da atenção”, em que refere que a nossa atenção é algo valioso e as empresas estão dispostas a muito para garantir de detêm a nossa atenção e consequentemente a nossa intenção de consumir. Como ele refere “a riqueza da informação cria a pobreza da atenção”, e com a infinita informação que temos, quão pobre está a nossa atenção?
Dicas para “desfritar” o cérebro
Algumas dicas para desativar o cérebro pipoca, e mantê-lo focado:
1. Mantenha um registo da sua vida online: registe quanto tempo gasta online e em que períodos.
2. Defina limites: tal como numa dieta, para restringir calorias, também pode restringir tempo online: coloque janelas temporais, por exemplo dar 1 hora para fazer tudo online e depois ir para a vida offline
3. Período off: marque algumas horas do seu dia sem verificar nada online, apenas a fazer atividades que não necessitam de estar ligad@ à corrente online .
4. Olhe para a rua: através da sua janela, olhe apenas para a rua durante uns minutos e observe, o movimento, os elementos, as pessoas, novidades, apenas observe.
5. Procure estímulos para os sentidos: estimule o olhar, procure sons que estão à sua volta, tente perceber e distinguir os diferentes cheiros onde está
6. Slow-down: lentifique o seu cérebro (e a sua vida): procure alguns momentos para não fazer nada, simplesmente pensar, registar, estar em devaneio, tomar um banho prolongado, fazer um puzzle ou tricô. alguma atividade que demore, que não tenha que acabar, que não tem marco de tempo, de pressa ou de grande estímulo.
7. Telefone àquela pessoa, que talvez até siga a sua vida, online, mas que provavelmente não fala com ela à tanto tempo.
Se precisar de ajuda para avaliar a sua situação e procurar estratégias adequadas que promovam a melhoria do seu bem-estar, contacte-nos.
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Bibliografia
Levy, David M., Daryl L. Nardick, Jeanine W. Turner, and Leanne McWatters (2011). “No Cellphone? No Internet? So Much Less Stress,” Chronicle of Higher Education.
Yuan K, Qin W, Wang G, Zeng F, Zhao L, Yang X, et al. (2011) Microstructure Abnormalities in Adolescents with Internet Addiction Disorder. PLoS ONE 6(6): e20708. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0020708
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