O sono é uma necessidade homeostática, que influencia e é simultaneamente influenciada pela diversidade de atividades, papéis e contextos de vida. É uma necessidade essencial ao bom funcionamento orgânico, cognitivo e emocional.
O sono modifica-se ao longo da vida, em particular na fase da adolescência, em função das transformações biológicas e através de influências psicológicas, culturais e sociais. Para a manutenção de um bom estado de vigília, os adolescentes necessitam em média de 9 a 10 horas de sono por noite. Infelizmente, constata-se que na nossa sociedade os adolescentes dormem muito menos do que necessitariam. Nos padrões de sono típicos dos adolescentes, verifica-se uma tendência para a privação crónica de sono, gerando uma dívida de sono de grandes dimensões.
- Que alterações contribuem para o défice de sono nos adolescentes?
O défice de sono resulta da convergência de várias influências biológicas e psicossociais.
Em termos biológicos, alterações dos sistemas de regulação do sono tornam fisicamente mais fácil ao adolescente ficar acordado mais tempo. Estas alterações dependem das mudanças hormonais ocorridas na puberdade. Englobam o adiar para um momento mais tardio a diminuição da temperatura corporal, que favorece o sono, assim como a secreção de melatonina, enquanto que a do cortisol acontece mais tarde durante a manhã. Estas alterações causam assim um atraso de fase circadiano nos adolescentes, que sentem sono mais tarde e acordam mais tarde.
As questões de ordem psicossocial englobam fenómenos como o acesso generalizado às novas tecnologias ou o excesso de atividades diárias, que implicam frequentemente prescindir de algumas horas de sono. A utilização de dispositivos eletrónicos como os tablets e telemóveis causam impacto até a nível biológico, promovendo um atraso na secreção de melatonina através das fontes luminosas azuladas dos seus ecrãs.
O excesso de atividades diárias atua por vezes em conjunto com horários de deitar selecionados pelo próprio adolescente como afirmação da sua crescente autonomia, e incompatíveis com horários escolares que iniciam cedo.
- Consequências de uma frágil qualidade de sono
O défice de sono é preocupante, podendo ter graves consequências para a saúde dos adolescentes, para o seu desenvolvimento e rendimento escolar.
A sonolência diurna serve de base para o aumento de dificuldades cognitivas, tais como as atencionais e de memorização, contribuindo para o insucesso académico. A privação de sono na adolescência tem sido relacionada também com o despoletar de perturbações do humor e ansiedade, as quais potencializam problemas de comportamento, pautados por conduta agressiva, acidentes, abuso de substâncias e comportamentos de risco mais acentuados. No domínio das consequências para a saúde, destacam-se o aumento da probabilidade de doenças como diabetes, hipertensão, e obesidade.
Quando as fragilidades na qualidade do sono aumentam, aumentam também os níveis de psicopatologias já instaladas, como a ansiedade e depressão.
Uma boa avaliação da privação de sono pode ser importante. Quando é que a sonolência de um adolescente é significativa?
- Sinais de alerta
- Faltas frequentes a aulas no período da manhã;
- Diminuição acentuada de energia;
- Alterações bruscas no rendimento escolar;
- Adormecimento durante as aulas;
- Alterações de humor acentuadas;
- Necessidade de dormir sestas prolongadas durante o dia;
- Acordar com frequência próximo da hora do almoço ao fim de semana.
Para a prevenção do défice de sono nos adolescentes é de grande importância que estes (e os seus pais) obtenham informação acerca das alterações biológicas que ocorrem nesta fase do desenvolvimento, assim como das necessidades de sono adequadas à idade e os efeitos prejudiciais do sono insuficiente sobre o desempenho e saúde em geral.
Garantir a qualidade do sono deve ser sempre prioritário, e há pequenas mudanças que podem fazer a diferença:
– Manter todos os dispositivos eletrónicos fora do quarto na altura de dormir (pode ser útil redigir um “contrato” para uma desconexão das tecnologias a uma hora razoável);
– Ser regular na hora de deitar e de acordar;
– Manter atividades relaxantes à noite;
– Evitar excesso de trabalhos escolares antes de dormir;
– Evitar bebidas estimulantes e nicotina perto da hora de deitar;
– Manter o quarto fresco, silencioso e com pouca luz;
– Manter uma atividade física regular e moderada durante o dia
- E quando já existe um problema instalado, como é a intervenção na área da psicologia?
Para os adolescentes com défice de sono, a intervenção psicoterapêutica pode envolver medidas como a psicoeducação, o treino de técnicas de relaxamento e a implementação de mudanças comportamentais com vista à regularização do horário de deitar e acordar. Adicionalmente e sempre que fizer sentido, são avaliados e trabalhados aspetos psicopatológicos que possam estar a contribuir para a manutenção da problemática, como humor deprimido e ansiedade, cujas preocupações e ruminações mentais têm forte ligação com dificuldades em iniciar e manter o sono.
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BIBLIOGRAFIA
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Pinto Seixas, M. (2009). Avaliação da Qualidade do Sono na Adolescência: Implicações para a Saúde Física e Mental. Porto, Universidade Fernando Pessoa
Rebelo Pinto, T., Carneiro Pinto, J., Rebelo-Pinto, H., Paiva, T. (2016). O sono em adolescentes portugueses: Proposta de um modelo tridimensional. Análise Psicológica, 4 (XXXIV): 339-352
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