Ser Família e, viver no seio de uma, pode ser uma das maiores dicotomias em que vivemos.
Ao mesmo tempo que é o primeiro lugar de confiança e cuidado, pode ser, também, uma das maiores fontes de stress, preocupação e conflitos.
Dizer isto não faz da família um lugar “errado”, que deva ser erradicado. É expectável que os lugares que importam para cada um de nós tenham estes dois lados (quando não mais…). O lado confortável, que nos faz sentir bem por estar lá. E o lado desafiante, que traz desconforto, preocupação, medo de perder esta coisa ou lugar que é importante para mim.
Não há forma de eliminar os desafios que se vivem em família. A família é um conjunto de elementos, todos diferentes, que enfrentam, individualmente e em conjunto, os seus próprios desafios. Para não viver estes desafios, só fugindo de viver em família ou, então, negar a possibilidade a cada elemento de trazer desafios e de se expressar sobre eles no seu contexto familiar.
Para viver em família com espaço para lidar com todos estes desafios, é importante treinar a nossa flexibilidade psicológica, que pode ser definida como a capacidade para lidar com desafios, procurar diferentes perspectivas, perceber e reagir ao nosso comportamento e agir no sentido daquilo que é importante para nós.
Segundo a Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT), existem três componentes importantes para desenvolvermos flexibilidade psicológica na nossa vida:
- A abertura: capacidade de perceber e estar nos sentimentos e pensamentos difíceis, ouvindo-os.
- A presença: capacidade de estar em contacto com o que acontece no momento presente, observando-me a mim e ao que me rodeia.
- O compromisso: o “para quê” de fazer certa coisa, o valor que está por trás e que motiva a lidar com desconforto e desafio.
Desenvolver a flexibilidade psicológica ajuda-nos a melhorar a vivência dos desafios em família. Pais e filhos com maior flexibilidade psicológica:
- Conseguem reconhecer o que sentem e ouvir a informação que os seus pensamentos e emoções lhes trazem, com abertura e curiosidade, sem fugir ou evitar;
- Conseguem estar atentos a si e aos outros, bem como estar presentes nos momentos partilhados;
- Agem comprometidos com o que é importante para cada um e para a família num todo.
Em síntese, uma família que treina a sua flexibilidade psicológica é uma família aberta ao que acontece e, ao que cada membro é, mesmo quando não são os planos mais desejados para si ou para os filhos; que consegue estar em contacto com as suas emoções e pensamentos, reconhecê-los e observá-los com curiosidade, capaz de estar em contacto consigo e presente para cada familiar; e, ainda, que conhece os seus valores e compromissos enquanto família e se move na sua direção, ainda que, para tal, possa ter que enfrentar um trajecto desafiante.
Os desafios fazem, e farão sempre, parte da convivência de uma família. Pais que criam um contexto familiar onde se treina a flexibilidade psicológica poderão contribuir para a melhoria da gestão da vida de cada membro da família, do desempenho do papel de pais e, também, da vivência e desenvolvimento psicológico saudável dos filhos.
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Hayes, S. C., Wilson, K. G., Strosahl, K. D. (2016). Acceptance and Commitment Therapy: The Process and Practice of Mindful Change. Reino Unido: Guilford Publications.
Hayes, D. S. (2019). A Liberated Mind: The Essential Guide to ACT. Reino Unido: Ebury Publishing.
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(Por) Famílias com maior Flexibilidade Psicológica
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