Hoje em dia quase tudo é instantâneo. Há até quem nos queira convencer que a felicidade e o bem-estar são instantâneos.
Por isso, vai inevitavelmente existir frustração em barda. Porquê?
Porque o bem-estar não é rápido, não chega à velocidade de um tweet ou frase motivacional.
Porque, de uma forma geral, nos convencemos que comer descartável é normal, “porque tem de ser”.
Porque o esforço que o foco e a paciência exigem são hoje um sinónimo de aborrecimento.
Porque o tédio e a mediocridade se instalam na nossa vida e não existem livros de auto-ajuda, workshops de gurus, mezinhas em frascos, nutrições maradas que nos possam transformar como um processo psicoterapêutico o faz.
Porque estamos fóbicos a emoções e à possilidade de dor e precisamos delas para conhecer o bem-estar.
Por tudo isto, olhar para a psicoterapia é como olhar para um alguidar azul vazio.
Um alguidar onde sabemos que vamos bater a massa das filhoses e, por muito que nos expliquem o que vai acontecer, só conheceremos os seus benefícios depois de fazer.
A princípio estamos entusiasmados, principalmente com a farinha, que faz fogo de vista. Depois, o avô diz-nos que temos de mexer com a mão e antebraço. Uma mão a agarrar no alguidar azul (onde já muitas filhoses foram feitas) e a outra a mexer vigorosamente a massa. Pôr a mão na massa é uma expressão clássica. E, não é por acaso. A massa dentro do alguidar fica espessa, difícil de mover e aí começa a doer. Dói o antebraço, dói o ombro e nós continuamos a mexer. Pensamos “a sério que isto custa assim tanto?”. Pensamos nas várias filhoses que já comemos porque alguém as fez, sem sabermos o que custava amassar. Gratidão. E continuamos a mexer com força. Pensamos em desistir, porque não vale a pena o esforço (nesta fase já nem nos lembramos que estamos a fazer filhoses). E, de repente, a voz que nos traz o alívio:
– Está boa a massa. Vamos pôr ao lume.
Sabemos que já passámos a dor. Todo o nosso esforço, concentração, persistência são agora compensados com a criatividade de colocar as filhoses em azeite a ferver. Podemos fazer as formas que quisermos
– Quero fazer passarinhos avô! (filhoses de passarinhos, só na cabeça de uma criança).
e a massa começa a fritar. A cor muda do esbranquiçado mole para um dourado que crepita. Já só falta tirar e deixar arrefecer. Mais um pedaço de tempo que passa.
Não existem filhoses instantâneas.
Não existe felicidade instantânea ou bem-estar fácil.
A psicoterapia é o espaço onde podemos criar bem-estar. É um alguidar azul vazio que sustenta o trabalho sobre uma massa que vai ganhar forma e cor quando é testada no mundo. Mas exige esforço, persistência e ciência. Não há mudança, nem crescimento de outra forma.
E quem disser o contrário é porque nunca sentiu o sorriso de orgulho do avô enquanto partilhavam juntos a filhós. Ou a felicidade.
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