Em 2020, em Portugal, a taxa de divórcio foi de 91,5%. Isto significa que significa que por cada 100 casamentos, 91 terminavam em situação de divórcio (PORDATA; 2022).
O divórcio e as separações, são transições de vida difíceis que implicam a readaptação a uma nova realidade e situação familiar, a vivência de múltiplas e intensas emoções que necessitam de ser processadas e integradas, podendo, ainda, estar associada a sentimentos de perda e à necessidade de reconstrução de um novo sentido para a vida. Este processo, pode tornar-se mais exigente quando existem filhos que requerem um esforço acrescido, por parte dos pais, para manterem uma coparentalidade positiva, isto é, para manterem, entre si, a capacidade de comunicar, trabalhar em equipa e resolver problemas, de modo a promover a estabilidade e crescimento saudável das crianças.
Por não ser um processo fácil, várias são as situações de divórcio envoltas em litígios parentais intensos. Nos casos mais graves, estas situações podem originar a quebra do contacto regular entra as crianças e um ou mais familiares de referência, como um pai/pai, um avô/avó, entre outros.
A crescente evidência científica tem salientado a importância de as crianças preservarem as suas ligações psicológicas profundas, nomeadamente no que diz respeito à continuidade das relações afetivas estruturantes e do seu interesse, na manutenção e promoção da sua saúde mental e desenvolvimento saudável. Isto porque, é nas relações afetivas, que a criança estabelece com as suas figuras de referência/vinculação, que esta desenvolve o seu sentido de personalidade e sentimentos básicos de confiança e segurança em si própria e nos outros. Por esta razão, torna-se fundamental compreendermos como podemos apoiar as crianças e os seus cuidadores a enfrentarem este desafio inesperado, preservando o seu bem-estar e o superior interesse das crianças. Exponho, em seguida, uma lista de alguns aspetos a ter em conta:
- O nível de desenvolvimento da criança: Face a uma situação de divórcio ou separação, pode existir uma recusa por parte da criança em querer manter o contacto com o outro progenitor/a, com quem deixa de conviver com maior regularidade. No entanto, a maior parte das crianças não desenvolveu, ainda, maturidade suficiente para compreender o impacto que este tipo de decisões tem na sua vida e no seu bem-estar. Os sentimentos de medo, culpa, insegurança e proteção são comuns e expectáveis. Para ajudar os seus filhos a ultrapassar esta situação pode:
- Apoiá-lo a reconhecer e expressar as suas emoções, validando que estas são normais e esperadas;
- Procurar compreender os motivos da recusa ou receio por parte da criança
- Ajudá-lo a identificar estratégias para ultrapassar as dificuldades identificadas
- Se necessário, procure ajuda especializada para si ou para a criança
- Os processos de regulação das responsabilidades parentais e as audiências técnicas especializadas: A convenção sobre os direitos das crianças tem investido na criação de políticas que garantam à criança, de acordo com a sua idade e maturidade, o direito de exprimir livremente a sua opinião acerca de questões que lhe dizem respeito. Nos processos de regulação das responsabilidades parentais procura-se, cada vez mais, assegurar que as crianças possam ser ouvidas, em sede de tribunal. Porém, estes momentos podem ser vividos com elevada ansiedade, receio e insegurança. É por isso importante:
- Ajudar a criança a compreender que a sua participação é importante, embora seja apenas um de vários fatores que serão considerados nas decisões finais. Isto é fundamental para aliviar a pressão e responsabilidade que muitas crianças sentem.
- Preparar a criança para o momento da audição, explicando o que irá acontecer, quem irá estar presente, para que esta saiba o que esperar e com o que contar. Existem alguns livros que podem apoiar na explicação destas informações (e.g., O João vai ao tribunal);
- Após o momento de audição elogiar a criança pelo seu envolvimento e permitir que esta partilhe consigo apenas a informação com a qual se sente confortável/preparada. Um questionamento intrusivo pode ser sentido como ameaçador e algumas crianças necessitam de tempo para processar a experiência;
- O Bem-Estar Parental: Por fim, um dos aspetos fundamentais para salvaguardar o superior interesse das crianças, diz respeito à necessidade de promover o bem-estar e a saúde dos próprios pais. As crianças pequenas regulam as suas emoções através dos seus cuidadores. À medida que crescem, tornam-se mais autónomas na sua gestão emocional, embora os pais continuem a ser cruciais, quer através de estratégias diretas, como indiretas (e.g., ensinando estratégias para gerir as emoções e modelando). Por essa razão, é importante que os pais envolvidos em situações de divórcio e separação, deem a merecida atenção à sua própria saúde e bem-estar. Isto pode ser obtido de formas diversas como:
- Procurar apoio especializado em saúde mental
- Integrar um grupo de desenvolvimento de competências parentais, constituído por indivíduos que estão a ultrapassar situações semelhantes
- Procurar o apoio da sua rede familiar e de amigos
- Reservar tempo para o autocuidado parental (e.g., ouvir música, dar uma caminhada, ler um livro, ver uma série nova)
Porque o superior interesse das crianças implica também promover o bem-estar parental!
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O Superior Interesse da Criança e as situações de litígio parental
Em 2020, em Portugal, a taxa de divórcio foi de 91,5%. [...]