Sexualidade: um palco para a performance
Quando a ansiedade domina o cenário
Embora ainda envolta em diversos tabus, vergonhas e medos, a sexualidade é uma das esferas mais importantes da nossa vivência. Nela aglomeram-se a satisfação de necessidades vitais para o nosso bem-estar, como o sexo, saúde, a intimidade, o sentimento de pertença, autoestima e, porque não, criatividade e espontaneidade.
Se a sexualidade diz tanto sobre a nossa natureza, será de esperar que a questão da performance, mediante determinadas metas e expectativas, também aqui se traduza.
A resposta sexual está longe de ser apenas fisiológica, e está imbuída em variáveis emocionais que têm um impacto significativo no modo como se manifesta. Quando não se atinge o desempenho sexual esperado, é comum surgir ansiedade no que diz respeito à sexualidade.
Algumas das causas que originam ansiedade de desempenho sexual podem ser:
-receio que o/a parceiro/a não fique satisfeito/a
-imagem corporal pobre
-medo de que o pénis não tenha o tamanho suficiente ou de ejacular rápido demais
-medo de demorar muito a atingir o orgasmo ou não o atingir de todo
A ansiedade gera a uma resposta fisiológica que em nada condiz com uma relação sexual satisfatória, levando, por exemplo, à segregação de hormonas relacionadas com o stress, como a noradrenalina. Ao preparar o corpo para uma reação de luta ou fuga perante uma situação de potencial ameaça, a ansiedade dificulta também a irrigação sanguínea de áreas erógenas, nomeadamente a zona genital. Além disso, surgem pensamentos negativos relacionados com a experiência sexual, como, por exemplo, “Nunca mais vai correr bem” “Tenho um problema.” “Ele/a não vai ficar satisfeito/a.” E esta é a fórmula para que tudo corra mal.
A ansiedade de desempenho sexual também existe no feminino, sabia?
Habituamo-nos a ouvir falar de desempenho sexual no que diz respeito à sexualidade dos homens, quanto mais não seja naqueles anúncios de medicamentos que prometem jovialidade sexual eterna. De acordo com o duplo padrão sexual – comportamentos sexuais socialmente esperados de acordo com o género –, aos homens é imputada a responsabilidade de levar a cabo o ato sexual. Há que manter uma ereção suficientemente forte, que agradar a parceira (sim, porque raramente se fala de parceiro), e por aí em diante. Se corre mal, então a sua virilidade fica em causa. Escusado será dizer que esta expectativa de performance gera no sexo masculino uma ansiedade que é, não raras vezes, contraproducente, levando frequentemente a dificuldades de ereção, de ejaculação e falta de desejo sexual.
Mas do lado das mulheres também existe algo a apontar, embora se fale menos disso. Por exemplo,existe a expetativa de que a mulher deve ter sempre orgasmo, e, se possível, apenas com penetração – quando sabemos que cerca de 70 % precisa de estimulação clitoriana para atingir o clímax. Devido a esta pressão, aproximadamente a mesma percentagem de mulheres finge o orgasmo com o objetivo de agradar o parceiro (este fenómeno é maioritariamente estudado em casais heterossexuais), evitar uma relação sexual dolorosa ou “parecer normal”.
Por outro lado, espera-se que o desejo sexual seja sempre espontâneo, como acontece no início da relação, quando se sabe que isso é pouco provável, sendo que este tipo de desejo é inversamente proporcional à duração do relacionamento. Há, por isso, que conscientemente criar as condições para que surja o desejo a que chamamos de responsivo. Também no que diz respeito à excitação, a ansiedade de desempenho sexual pode diminuir a lubrificação na mulher, levando a dor e desconforto.
Colocar a ansiedade nos bastidores
Se a ansiedade de performance lhe cria dificuldades no âmbito sexual, aqui ficam algumas dicas do que fazer:
-melhorar a comunicação com o/a parceiro/a, expondo vontades e receios, para que o sexo seja um espaço seguro
-descobrir outras formas de sexualidade para além da penetração, como carícias ou outras formas de práticas sexuais
-utilizar algumas estratégias de relaxamento, para deixar de antecipar a resposta sexual
-falar com um/a terapeuta sexual, com quem poderá obter informação e trabalhar estratégias para reduzir a ansiedade de desempenho sexualidade
-tomar medicação – sempre com prescrição médica – pode ser uma hipótese, sobretudo no caso das dificuldades sexuais masculinas.
E quando é benéfico um pouco performance?
O duplo padrão sexual, descrito anteriormente, leva a que homens e mulheres tenham vivências diferentes da sexualidade. Presentemente, as mulheres ainda são vistas como tendo menor desejo sexual, crença integrada pelas próprias, o que é paradoxal com o facto de tanto as mulheres como os homens acreditarem que a vida sexual é crucial para o bem-estar da relação. Falando de casais heterossexuais, isto leva a que haja uma negociação, e ajustamento da performance de cada elemento do casal. Para promover a proximidade, muitas vezes o homem acaba por ajustar-se às necessidades da mulher, contribuindo mais para as tarefas domésticas e tendo em conta o namoro, fatores essenciais para o despertar na libido feminina. Já no caso da mulher, existe também um esforço para trabalhar o desejo sexual de modo a aumentar as interações sexuais. Ou seja, ambos ajustam o seu desempenho, encontrando um espaço comum que permite o bem-estar do casal.
Fontes:
Bancroft, J., & Janssen, E. (2000). The dual control model of male sexual response: A theoretical approach to centrally mediated erectile dysfunction. Neuroscience and Biobehavioral Reviews, 24, 571-579.
Bancroft, J. (2001). Commentary: Conceptualising women‘s sexual dysfunction. Journal of Sex & Marital Therapy, 27, 95-103.
Crawford, M., & Popp, D. (2003). Sexual double standars: A review and methodological critique do two decades of research. The Journal of Sex Research, 40, 13-26.
Elliot, S. & Umberson, D. (2008). The Performance of Desire: Gender and Sexual Negotiation in Long-Term Marriages. Journal of Marriage and Family, 70(2): 391–406
Rita Torres
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