Não é uma pílula dourada, mas sabemos que a prática de uma atitude não-crítica e enraizada no momento presente muda o cérebro.
Em 2011 um estudo publicado pela Psychiatry Research partilha os aumentos significativos observados na densidade da matéria cinzenta dos participantes que completaram um programa de oito semanas de Mindfulness. Em 2015 uma equipa de cientistas da Universidade da Columbia Britânica e da Universidade de Tecnologia de Chemnitz reuniu mais de 20 estudos, para determinar que áreas do cérebro seriam consistentemente influenciadas pela prática meditativa.
Partilho consigo duas (das oito) regiões identificadas, com especial interesse para o estilo de vida da nossa sociedade atual.
O cortéx cingulado anterior – uma estrutura localizada no interior da testa, que está associada à auto-regulação, ou seja, à capacidade de direcionar a atenção para um ponto escolhido, assumir um determinado comportamento, cessar uma resposta inadequada ou mesmo mudar de estratégia. Pessoas que têm lesões nesta estrutura (ou na comunicação desta estrutura com outras zonas do cérebro) são mais impulsivas, agressivas, exibem menos flexibilidade mental, nomeadamente no que diz respeito à resolução de problemas. Praticantes de mindfulness têm mais capacidade de auto-regulação, concentração e “mais atividade” no cortéx cingulado anterior, quando comparados com não-praticantes, o que lhes confere vantagem na tomada de decisão, uma vez que esta estrutura reúne condições ótimas para suportar aprendizagens com a experiência passada.
Outra zona cerebral que se destacou foi o hipocampo, uma vez que mostrou maior densidade nos cérebros dos participantes do programa de atenção plena de 2011. Esta área faz parte do sistema límbico (um conjunto de estruturas internas associadas à emoção e à memória) e por estar rodeada de receptores de cortisol (hormona do stress), torna-a particularmente sensível ao stress crónico (por exemplo, indivíduos que sofrem de depressão ou perturbação pós-stress traumático tendem a ter um hipocampo menor) e fundamental na capacidade de resiliência.
Mas não se esgotam aqui os ganhos desta prática secular que beneficia percepção, tolerância à dor, regulação emocional, introspecção, pensamento abstracto… A prática de mindfulness cultiva ainda a consciência corporal e consciência no corpo das nossas sensações físicas, emoções e atividade mental… permitindo que o nosso corpo seja condutor e simultaneamente testemunha fisiológica de histórias verbais e não verbais, implícitas e explícitas, caminhando ao encontro de um estado de tranquilidade e aceitação, que nos permita estar em paz! É nesse momento que o nosso batimento cardíaco se alinha, a nossa respiração se alonga… e podemos dizer que estamos bem.
Quando nos sentamos, respiramos e comprometemos a ser conscientes, mantemos os nossos cérebros saudáveis, auscultando apêgos e aversões, energias e enfados, focos e bloqueios… mas também cultivamos esta “escuta do corpo”, reparando posturas, contrações musculares, padrões de respiração… restaurando, assim, a capacidade de notar e acolher cada conteúdo da nossa vida, a fim de o compreender, lidar, lembrar ou simplesmente largar.
A prática de mindfulness cultiva a presença ou o encontro com as dores do (nosso) mundo, permitindo uma maior ressonância… porque os sintomas são muitas vezes muito menos do que aquilo que fazemos com eles.
É desfrutando da prática que se conquista serenidade e é no presente que afinal se ganha mais, sem necessariamente ambicionar nada.
Autoria
Quando a cabeça (não) tem paz, o corpo é que paga
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