Ninguém duvida do impacto positivo que a tecnologia tem na nossa sociedade, em termos de eficiência, conforto e comunicação. Mesmo na área da Psicologia e das intervenções psicoterapêuticas, a tecnologia surge como aliada, através de uma panóplia de aplicativos que nos ajudam a meditar, gerir sintomas e mais recentemente, a investigação mostra-nos resultados promissores com o uso da realidade virtual em diversas perturbações.
Mas temos de olhar também para o outro lado da moeda: a tecnologia utilizada em excesso pode ter um efeito avassalador nas nossas vidas. Mas como se mede o que é o excesso? Quantos de nós, já estivemos num café ou numa esplanada com os nossos amigos e damos por nós a espreitar o telemóvel? Ou no cinema? Ou durante uma tarefa de trabalho? Ou durante uma refeição? E os exemplos poderiam ser muitos… Parecemos incapazes de nos separar de nossos smartphones, tablets e inúmeras plataformas de redes sociais. Os sons das notificações tornaram-nos híper-responsivos. O Sr. Ivan Pavlov ficaria orgulhoso. Pavlov conseguiu que os seus cães salivassem ao som de uma campainha e as notificações conseguem que nós interrompamos tudo o que estamos a fazer.
De facto, a tecnologia não só mudou a maneira como percebemos o mundo, mas também como os nossos cérebros recebem e processam informações. Sabia que, de acordo com a Universidade de Califórnia, após uma notificação nos forçar a alternar entre tarefas, pode levar-nos cerca de 23 minutos para voltar à tarefa inicial? “Ah, mas eu não respondo à notificação…” Mesmo assim o seu fluxo de pensamento e concentração fica interrompido por ver a notificação, processar e determinar se responde ou não. Estas distracções afectam relacionamentos, produtividade, aprendizagem e até criatividade e capacidade de ser contemplativo. Melhorámos a nossa capacidade de multitasking (achamos nós), mas na realidade estamos a alternar entre tarefas. Esta troca é cansativa porque gasta glicose oxigenada no cérebro, esgotando as mesmas reservas de energia necessárias para nos concentrarmos em concluir uma tarefa. O resultado final é uma sensação de insatisfação e de missão não cumprida, sentindo que não fomos produtivos e não atingimos as nossas metas.
E tenho ainda outra coisa para lhe dizer: não sei se sabia, mas as aplicações e plataformas tecnológicas foram criadas para fazer cócegas no cérebro e libertar dopamina que activa o nosso centro de prazer e recompensa. Nir Eyal autor dos livros Indistractable e Hooked: How to Build Habit-Forming Products explica: um gatilho interno (necessidade de conexão social) ou um gatilho externo (uma notificação) inicia o ciclo viciante, respondemos ao gatilho executando uma ação (abrimos o Facebook) e temos uma recompensa (“Oh, eu tenho sete notificações!”) e investimos ainda mais na plataforma (comentamos). O ciclo continua activado e o próximo gatilho pode ser: “Será que alguém respondeu à minha publicação?” Quando damos por nós, estamos a dar mais voltinha no carrossel! Há gratificação ao ver novas notificações e mensagens, razão pela qual alguns de nós verificam compulsivamente as nossas aplicações, várias vezes ao dia.
E finalmente temos o FOMO. Perguntam vocês o que é o FOMO? É o acrónimo de Fear of Missing Out, que em português significa “Medo de ficar de fora” isto é, medo de perder algo que se considere interessante e de estar desligado da Internet. Isto pode causar níveis de ansiedade, precisamente por haver a sensação de se estar a perder uma série de acontecimentos e eventos que os amigos ou outras pessoas estão a fazer.
Se calhar chegou a altura de repensar a sua relação com o telemóvel de forma a criar um relacionamento sustentável e saudável.
Seja o mestre da sua Tecnologia
- Veja a tecnologia com uma nova perspectiva: o tempo que despende, por exemplo, nas redes sociais é tempo que não usa para outras actividades como sair com um amigo, fazer desporto ou um hobby. Vamos a números: 5 minutos por dia em redes sociais são 30 horas por ano, 15 minutos por dia são 91 horas por ano, 30 minutos por dia são 182 horas por ano, 1 hora por dia são 365 horas por ano. Veja o que ganharia de tempo por ano noutras actividades.
- Preste atenção ao seu corpo quando está a utilizar o telemóvel, repare como está a sua postura, a sua respiração, como se está a sentir… Quantas das nossas distracções e da nossa procura do telemóvel são estimuladas, não pelos gatilhos externos (notificações), mas por estados emocionais desconfortáveis, dos quais procuramos fugir. Os suspeitos do costume podem ser o tédio, solidão, fadiga, stress ou ansiedade. Quanto mais sintonizado estiver com as suas próprias experiências no momento, mais fácil será mudar seu comportamento ou executar uma acção que dê uma resposta mais directa e eficaz ao que possa estar a sentir.
- Use a tecnologia para se proteger da tecnologia e prepare-se para o sucesso: existem aplicações que lhe dizem quanto tempo esteve ligado, por exemplo, numa rede social (prepare-se para ficar horrorizado), aplicações que lhe permitem bloquear as notificações, pode activar o modo de voo em alguns momentos do dia; estabeleça regras, como por exemplo não ter o telemóvel em cima da mesa durante as refeições.
- Abrace o JOMO (Joy of Missing Out) e seja existencial (se tudo falhar): tal como existe o Fear of Missing Out há a Joy of Missing Out, ou seja a Felicidade de estar a perder alguma coisa nas redes sociais, mas sem que isso seja um problema; é aceitar que estar longe também é ganhar qualquer coisa, nem que seja um momento para si. Se tudo falhar, considere sua própria mortalidade. Quantas pessoas, às portas da morte, acha que vão dizer: “Eu desejava ter passado mais tempo no Instagram”?
Sabia que a próxima grande tendência tecnológica é a Humanidade? Quer ter FOMO ou JOMO?
Qual foi o interesse que este artigo teve para si?
Meus caríssimos colegas, como sempre tão pertinentes os vossos artigos. Este tem particular interesse pois vivo essa realidade dentro de casa (a nível da relação com o meu marido). Não tem sido fácil sensibilizar o meu companheiro para reconhecer a sua dependência (no caso não das redes sociais em si mas de um jogo que mantém desde há alguns anos on-line com pessoas de vários cantos do mundo). Percebeu agora que foi necessário remover o jogo do seu telemóvel, pois passava de facto muito tempo dedicado a esta actividade, não percebendo tudo aquilo em que não estava a investir. Agora começa outra jornada.Muito obrigada pela partilha desta informação.
Forte abraço. Bem-hajam.
Criatividade, para que te quero?
Quantos de nós, já nos sentimos presos ou estagnados num problema? Quantos [...]